... a little note...

there's  a  translation  for  this  collection  of  letters...
at...  
http://luisantoniofreireenglishversion.blogspot.com/

... esse blog...

...  é  o  primeiro  de  uma  série  de  dois  volumes...
       o  segundo  encontra-se  em   
http://luisantoniofreiretwo.blogspot.com/

...introdução à série... "filosofando"...

...querida  mãe...

no  ano  de  2009...
escrevi  uma  série-de-cartas...  históricas...
para  meus  filhos...  tauê...  e...  peter...

na  realidade  são  cartas  auto-biográficas...
onde  procurei  seguir  uma  certa  ordem-cronológica...
que  vai  desde  os  fatos  em  boston..
...  onde  meu  pai  estudava  no  mit...

...até  a  rua  j.carlos...

depois  disso...  houve  uma  interrupção...
interrupção  essa...  que  dura  até  hoje...

...mas...  é  claro...
um  dia...  pretendo  dar  continuidade  ao  projeto...

enquanto  isso...
resolví...  re-transmitir  essa  coleção-de-cartas  para  você...
com  a  certeza  de  que  você  irá  gostar  dessa  leitura...
...  dessas  memórias...

me  despeço...
com  carinho...

um  grande  abraço...
                                  ...luis antonio...

...1... apenas filosofando... ( 1 out of 18 )...

querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

já  há  algum  tempo...  minha  mente  "viaja"  em  memórias...
relembrando...  vários  momentos  em  que  estivemos  juntos...

agora...  estou  com  a  vida  tranquila...
aqui  no  sitio...  com  a  maria...
numa  vida  boa...
numa  vida  que  pedí  a  Deus...

me  alimentando  bem...
com  uma   comidinha  que  a  maria   prepara  com  todo  amor...
em  suma...
com  uma  vida...  onde  não  tenho  nada  a  reclamar...

---   ---   ---

mas...  a  saudade  por  vocês  é  imensa...
mas...  tudo  bem...
não  quero  interferir  na  vida  de  vocês...
quero  que  vocês  sigam  a  vida  de  vocês...
com  coragem...  sabedoria...  delicadeza...
gentileza  para  com  todos  os  que  os  rodeiam...

que  saibam  lutar  pelos  seus  direitos  de  uma  forma  tranquila...
educada...  e...  sem  agressividade...

---   ---   ---

como  vocês  estão  nos  estados-unidos...
e  eu  no  brasil...
então...  a  forma  de  diminuir  essa  distância  entre  a gente...
é  escrevendo  emails  desse  tipo...

emails  onde  não  existe  um  assunto  pré- definido...
apenas  um  email  onde  a  conversa  flui...
pelo  simples  prazer  da  conversa  em  si...  

---   ---   ---

me  deu  vontade  agora...  de  falar  um  pouco  de  mim...
contar  para  vocês  um  pouco  da  minha  história-de-vida...
por  incrível  que  pareça...  muitas  vezes...
apesar  de  convivermos  juntos  um  tempão...
muitas  vezes...  esquecemos  de  parar...
para  contar  e  relatar  fatos  básicos  da  nossa  vida...
normalmente...  estamos  tão  absorvidos...
nas  preocupações  do  dia-a-dia...
que  esquecemos  de  reservar  aquele  tempinho...
para  REVELAR   para  as  pessoas  queridas  que  nos  envolvem....
coisas  tão  importantes  que  são  os  fatos  elementares...
da  nossa  própria  história...

quando  eu  tinha  seis  meses  de  idade...
eu...  minha  irmã  ana emília...  meu  pai  e  minha  mãe...
nos  mudamos  para  boston...
meu  pai  recebeu  uma  bolsa-de-estudos  da  marinha  brasileira...
para  fazer  o  master´s  program  no  MIT...
(massachusetts  institute  of  technology...)

como  ficamos  lá  apenas  três  anos...
não  me  lembro  de  nada  dessa  época...
só  sei  que...  depois...  minha  mãe  me  contava  histórias  do  tipo...
que  eu  nessa  época...  ainda  bebê...  não  queria  comer...
aí...  ela  me  levou  ao  médico  aí  em  boston...
e  ele  falou  que  era  para  ela  comprar  um  funil...
fazer  uma  sopa...
e...  enfiar  a  sopa  goela  abaixo  pela  minha  garganta...
através  do  funil...

e...  não  é que  ela  acreditou  no  médico...
e  tentou  fazer  exatamente  o  que  ele  havia mandado...?

---   ---   ---

vou  parando  por  aqui...  hoje...
pois  não  quero  tomar  muito  tempo  de  vocês  com  essa  leitura...

depois...  please...  me  avisem  se  vocês  estão  interessados...
em  saber  mais  sobre  a  continuação  do  relato  da  minha  vida...

se...  vocês  me  disserem  que  estão  interessados...
terei  muito  prazer  em  continuar...
escrevendo  emails  desse  tipo...

caso  contrário...
eu  vou  procurar  something  else  to  do...

please...  feel  free  to  ask  me  any  kind  of  questions...
dúvidas...  qualquer  tipo  de  dúvida...
qualquer  assunto...
do  passado...  presente  ou  futuro...

toda  a  atenção  que  dei  durante  toda  a  vida  para  vocês...
continua  de  pé...
vocês  sabem  disso...
e...  sabem  que  faço  o  possível  e  o  impossível  por  vocês...

por  favor...  me  considerem  sempre  como  um  amigo...
jamais  como  um  inimigo...

evitem  dar  ouvidos  a  maus  conselhos...
de  pessoas  que...  por  algum  motivo...
queiram  fomentar  uma  desunião  entre  nós...

nunca  deixem  se  iludir...
achando  que  eu  não  mereço  a  confiança  de  vocês...
seria  um  desperdício...
achar  que  eu  não  mereço  a  confiança  de  vocês...
e...  como  consequência  esconder  alguma  coisa  de  mim...

acredito...
que  existam  pessoas  que  fiquem  buzinando  no  ouvido  de  vocês...
que  sua  avó  leia  não  presta...  que  eu  não  presto...

respeito  a  opinião  dessas  pessoas...

mas...  se  dermos  ouvidos  a  esse  tipo  de  opinião...
acabamos  todos  afundando...
pois  a  forma  mais  fácil  de  enfraquecer  uma  pessoa...
é  botando  essa  pessoa  contra  seu  próprio  pai...
ou  contra  sua  própria  mãe...

na  sabedoria  popular...  tem  uma  frase  que  traduz  bem  esse  fato...
"a  união  faz  a  forca..."
(força...não  sei  se  o  teclado  de  vocês  aceita...
 o  c-cedilha  de  força...  forsa...  fortaleza...
 uma  pessoa  forte...)...

portanto...  uma  família  desunida...  é  uma  família  fraca...
todos  acabam  perdendo...

---   ---   ---

portanto...
se  começarmos  a  exercitar  o  exercício  de  nos  comunicarmos  mais...
isso  iria  nos  fortalecer  mais...
isso  iria  trazer  benefícios  para  todos  nós...

uma  família  que  não  conversa  entre  si...
se  torna  uma  família  fraca...
uma  família  frágil...
vulnerável  às  adversidades  da  vida...

vocês  estudaram  numa  escola  boa...  o  notre  dame...
vocês...  graças  a  Deus  têm  bons  princípios...
mas  esses  bons-princípios  devem  ser  constantemente  atualizados...
constantemente  melhorados...
constantemente  conscientizados...

o  mundo  dá  voltas...
uma  pessoa  pode  estar  bem  de  saúde  um  dia...
e...  no  outro...  estar  de  cadeira-de-rodas...

toda  a  atenção  é  pouca...

vamos  nos  unir  ainda  mais...?
vocês  seriam  capazes  de  confiar  em  mim  como  antigamente...?

obrigado  por  ler  esse  email...
até  já...
um  super-super-super  abraço...
seu  pai...
                 ...luis antonio...

...2... filosofando part two... ( 2 out of 18 )...


graaande...  tauê...
graaande...  peter...

pô...  legal...
assumindo  que  a  ideia  de  contar  histórias  da  minha  vida...
tenha  sido  bem  recebida  por  vocês...
vou  "meter  bronca"  no  projeto...
em  outras  palavras...  vou  "botar  a  mão  na  massa"...
(ou  melhor...  no  teclado...)...
e  ver  se  sai  alguma  coisa  que  presta...  desses  relatos...

no  último  email...  eu  ainda  estava  em  boston...
meu  pai  estudando  no  MIT...(massachusets  institute  of  technology...)...
minha  mãe  cuidando  de  mim  e  da  minha  irmã  ana emília...
e...  minha  mãe  tinha  levado  uma  empregada...(a  sebastiana...)...
do  brasil...  para  ajudá-la  nos  afazeres  domésticos...

morávamos  num  daqueles  bairros  residenciais  tranquilos...
onde  não  havia  muros  entre  as  casas...
na  rua...  quase  não  havia  carros...
e...  eu...  e  minha  irmã...  ficávamos  horas  brincando  na  rua...
com  o  velocípede...
(aquelas  bicicletinhas  para  criança...  com  três  rodas...)...

aí...  num  belo  dia...  eu  e  minha  irmã...
sem  querer...  nos  perdemos...  lá  por  aquelas  ruas  da  vizinhança...
minha  mãe...  ficou  desesperada...  chamou  a  polícia...
e...  a  polícia  acabou  nos  achando...

(meu  pai...  depois  me  contou...  que  a  estratégia  da  policia...
 foi  dar  uma  geral...  "varrendo"  numa  espécie  de  circulo  grande...
 as  ruas  da  vizinhança...
 depois...  ia  "varrendo"  por  círculos  cada  vez  menores...
 até  nos  achar...)

pena  que  meu  pai  não  esteja  mais  aqui  na  Terra...
pois  gostaria  de  ter  desenvolvido  mais...  essa  estória  com  ele...

anyway...  sei  que  depois  disso...  meus  pais  resolveram  botar  duas  coleirinhas...
como  se  fossem  coleirinhas  de  cachorro...  em  mim  e  na  ana emíla...
com  o  nome...  endereço...  e...  telefone...

---   ---   ---

eu  morei  em  boston...
dos  seis  meses  de  idade...
até  os  três  anos  de  idade...

não  me  lembro  de  nada...
a  não  ser  essas  duas  estórias  que  meus  pais  contaram...
a  do  funil...  e  a  da  coleirinha  de  cachorro...

de  boston...  fomos  pra  recife...
onde  morei  dos  três  aos  seis  anos  de  idade...

nessa  época...
eu  não  fazia  nada  na  vida...
ficava  o  dia  inteiro...  sentado  no  muro...
vendo  os  carros  passarem...
que  eram  poucos...  na  época...

engraçado...
como  a  criança...  é  um  ser  inocente...
é  capaz  de  ficar  horas  e  horas...
sem  preocupação...
só  curtindo  a  paisagem...
sem  pensar  em  nada...

sem  medos...
sem  ambições...
só  curtindo  o  momento...

quando  passa  uma  formiga...
a  criança...
simplesmente  olha  a  formiga...
simplesmente  acompanha  seu  movimento...

é  como  se  fosse  um  cachorro...
inocente...
desde  que  esteja  bem  alimentado...
sem  doenças...
com  o  sono  em  dia...

a  vida...  é...  simplesmente...  a  vida...
paz...  sem  julgamentos...
sem  complexos...
sem  obrigações...

(aliás...  essa  é  mais  ou  menos...
a  doutrina  yoga...
ela  diz  que  todos  nós...  mesmo  adultos...
podemos...(e...  devemos...)...  exercitar  o  exercício  de  ficar  todo  dia...
pelo  menos  quinze  minutos...  sem  fazer  nada...  só  respirando...
sem  pensar  em  nada...  tal  qual  aquela  criança...
com  quatro  anos  de  idade...  (ou  cinco)...
sentada  no  muro...  vendo  os  poucos  carros  passarem...)

em  resumo...  vivendo  o  momento...

---   ---

paro  por  aqui...?
paro  por  aqui...

senão...  vocês  vão  se  atrasar  para  os  quinze-minutos-de-yoga...

ficam  com  Deus...
Deus  proteja  vocês...
até  já...
um  abraço  apertado...
seu  pai...
               ...luis antonio...

...2.1... peter's reply...

vou considerar meus quinze minutos de ficar atoa, esses quinze minutos que passo lendo seus emails

de diarios (journals).
E isso ai Pai, to esperando o capitulo 3,
um abraco

Peter

...3... filosofando part three... ( 3 out of 18 )


querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

bem...  depois  da  interrupção  da  semana  passada...
que...  graças  a  Deus...  acabou  tudo  bem...
resolvi  retomar  as  estórias  da  história  da  minha  vida...
pois  o  email  anterior  estava  um  pouco  científico  demais...
e...  nada  como  escutar  uma  estória  mais  humana...
as  opposed  to  a  story  more  scientific...

(me  parece  que  as  estórias  mais  humanas  "entram"  melhor...
são  mais  fáceis  de  digerir...)

mas  isso  não  significa  que  as  estórias  mais  cientificas...
não  tenham  seu  devido  valor...
elas  também  são  importantes...
é  como  na  vida...
às  vezes  não  estamos  muito  entusiasmados...
para  fazer  certo  tipo  de  atividade...
(tirar  a  poeira  do  quarto...  por  exemplo...)
mas  temos  que  fazê-lo  anyway...

pois  se  não  o  fizermos...
acaba  que  respiramos  aquela  poeira  toda...
que  obviamente  nos  faz  mal...

(se  bem  que  li  num  livro...  em  tom  de  piada...
 que...  está  cientificamente  provado  que...
 depois  que  a  poeira  atinge  três  centímetros  de  altura...
 não  precisa  mais  limpar...
 pois...  está  provado...
 que...  depois  dos  três  centímetros...
 é  impossível  acumular  mais  poeira...)

---   ---   ---

tínhamos  parado  a  estória...  em  recife...
aos  quatro... (ou  cinco)  anos  de  idade...
sentado...  o  dia  inteiro  no  muro...
vendo  os  poucos  carros  passarem...
pensando  em  nada...
só  saboreando  o  momento...
sem  grandes  pensamentos...
sem  grandes  preocupações...

parece  que  minha  infância  foi  seccionada...
em  períodos  de  três  em  três  anos...
os  três  primeiros  anos  de  vida...  em  boston...
os  três  seguintes...  em  recife...
e...  os  três  seguintes  (dos  seis  aos  nove  anos  de  idade...)...
no  rio de  janeiro...

mais  precisamente...  no  bairro  que  faz  fronteira...
entre  o  jardim  botânico  e  a  gávea...
numa  rua  feita  de  paralelepípedos...
com  um  trilho  de  bonde  passando...
bem  no  meio  das  pedras  de  paralelepípedos...

um  lugar  meio  parecido  com  a  vila...  em  ipanema...
onde  vocês  brincavam  com  o  juninho...
e  a  turma  de  garotos  da  vila...

o  astral  era  parecido...
jogávamos  bola...
na  calcada  (calsada)  mesmo...
sem  muita  frescura...
não  era  necessário  um  campo  de  futebol...
para  podermos  jogar  bola...

a  calçada  era  perfeita...

eu  estudava  numa  escola  pública  na  lagoa...
ia  de  bonde  para  a  escola...
aos  oito  anos  de  idade...  minha  mãe...
disse  que  eu  podia  levar  minha  irmã  clarice
(que  tinha  quatro  anos  de  idade)  para  o  kindergarten  dela...
que  ficava  bem  em  frente  a  minha  escola...

e...  essa  era  a  cena...  eu  com  oito  anos...
levando  minha  irmã  (de  quatro)  para  a  escola  dela...
e...  de  lá...
eu  seguia  para  minha  aula  do  outro  lado  da  rua...

bons  tempos...  no  violence...  uma  vida  tranquila...

minha  mãe  me  dava  o  dinheiro  exato  da  passagem  do  bonde...
na  saída...  eu  não  precisava  mais  pegar  minha  irmã...
pois  minha  mãe  já  buscava ela  que  saia  mais  cedo  do  que  eu...

então...  na  saída  da  minha  escola...
como  eu  estava  com  o  dinheiro  certinho  da  passagem...
eu  preferia...  ao  invés  de  pegar  o  bonde...
preferia  gastar  o  dinheiro  da  passagem  no  saco  de  pipoca...
e  ir  para  casa  a  pé...

chegava  lá  na  rua...  já  caia  no  joguinho  de  futebol  na  calçada...
vida  tranquila  sem  grandes  preocupações...

mas...  nem  tudo  é  um  mar  de  rosas...
em  contraste  àquela  vida  de  sonhador  de  recife...  sentado  no  muro...
sem  pensar  em  nada...  só  vivendo  a  vida...

já  no  rio  de  janeiro...
aos  oito  anos  de  idade...
passei  por  uma  experiência...
que  me  fez  ver  que  nem  tudo  é  um  mar  de  rosas...

ao  chegar  da  escola...  a  pé...
chego  na  rua...  o  pessoal  jogando  bola...
chego  falando...
" pode  mandar...!!
   chuveirinho...!!
   pra  eu  cabecear...!!..."

e...  eis  que  meus  amigos  totalmente  me  ignoraram...
como  se  eu  não  existisse...
não  deram  a  mínima  atenção  para  a  minha  presença...
fizeram  questão  de  me  ignorar  de  uma  forma...
que  eu  nunca  tinha  visto  nada  igual  em  toda  minha  vida...

neste  ponto...  não  entendi  nada...
pensei  comigo  mesmo...  "o  que  está  acontecendo...?"

perguntei  a  eles...
e  eles  me  responderam...
que  estavam  "dando  um  gelo  em  mim"...

eu  não  sabia  o  que  esta  expressão  "dar  um  gelo"  significava...
eles  me  explicaram  que  queria  dizer...
que  é  quando  uma  pessoa  para  de  falar  com  a  outra...
por  algum  motivo...

aí  eu  perguntei  qual  era  o  motivo...
eles  me  responderam...
mas  eu  até  hoje  não  me  lembro  qual  era  o  motivo...

( acho  que  eu  estava  tão  chocado  com  o  lance  do  "gelo"  em  si...
   que...  quando  eles  me  explicaram  o  motivo...
   eu  ...  talvez  não  tivesse  nem  entendido  direito  o  motivo...
   e  nem  pedi  para  eles  me  explicarem  melhor...)

fiquei  meio  atordoado  com  essa  primeira  experiência  da  minha  vida...
de  sentir  que...  a  sociedade...
o  grupo  de  amigos  tem  essa  capacidade  de  te  rejeitar...

e...  a  vida  é  uma  sequência  de  aprendizados  desse  tipo...
a  vida  vai  passando...
episódios  desse  tipo  vão  acontecendo...  regardless  of  the  age...
independentemente  da  idade  em  que  estamos...

vamos  conhecendo  as  pessoas...
passamos  a  nos  sentir  bem  com  elas...
e...  de  repente...  acontece  algo...
escutamos  algo  dessas  pessoas  que  nos  surpreende...
nos  pega  de  surpresa...

é  como  se  fosse  uma  porrada  na  cara...
a  vida...  muitas  vezes  nos  "apronta"  algo  semelhante...

mas  esse  tipo  de  coisa  não  acontece  apenas  entre  duas  pessoas...
às  vezes  tais  surpresas...  tais  decepções...
surgem  entre  uma  pessoa  e  uma  instituição...
entre  uma  pessoa  e  um  governo...
entre  uma  pessoa  e  uma  escola...
entre  uma  pessoa  e  uma  corporação  onde  trabalha...

quando  eu  estava  no  hawaii...  ainda  nos  primeiros  anos...
quando  estava  estudando  no  mestrado  em  matemática...
me  dedicando  ao  máximo  para  ser  um  straight  "A"  student...
fazia  homeworks  exageradamente  caprichados...

no  primeiro  semestre  tirei  um  "A"...
no  segundo  semestre  tirei  um  "B"...
no  terceiro  semestre  tirei  um  "B"...
no  quarto  semestre  tirei  um  "C"...

de  repente...  recebo  uma  cartinha  da  faculdade...
dizendo  que  eu  fui  colocado  em  "probation"...  ou  seja...
se  eu  não  tirasse  um  "A"  no  próximo  semestre...
seria  expulso  da  faculdade...

foi  uma  espécie  de  "porrada"  na  minha  cara...
ter  percebido  que  eles  foram  tão  "duros"  para  comigo...
eu...  que  tinha  tentado  dar  o  máximo  de  mim...
como  um  estudante  nota-dez...

mas...  dessa  vez...  no  caso  da  faculdade...
me  deixei  derrotar  demais...
por  causa  de  uma  simples  cartinha  da  faculdade...

deveria...  em  face  da  carta...  procurar  ir  lá  na  faculdade...
me  informar  melhor  sobre  o  que  estava  acontecendo...
deveria  ter  procurado  ouvir  a  opinião  dos  meus  professores...
que  me  conheciam  profundamente...

e...  não  ter  me  deixado  abater  tanto  por  uma  carta...
que  talvez  tivesse  vindo...
de  um  departamento  administrativo  da  faculdade...
que...  talvez  não  tivesse  nem  nada  a  ver...
com  o  departamento  de  matemática  em  si...

mas...  o  mundo  dá  voltas...
depois  daquela  carta...
por  coincidência...  meu  nervo  ciático  se  agravou...
ao  ponto  de  eu  não  poder  nem  sentar...  nem  ficar  de  pé...
tive...  realmente  que  desistir  da  matemática...
acabei  entrando  pra  música...  que...  sem  dúvida...
me  acrescentou  bem  mais  como  ser  humano...

e...  voltando  à  turminha  do  futebol  da  época  dos  meus  oito  anos...
depois  que...  pela  primeira  vez  na  vida...
senti  o  gostinho  amargo  de  uma  rejeição...
por  parte  do  grupo  de  amigos...

depois  disso...
felizmente...  depois  de  uns  dois  ou  três  dias...
tudo  voltou  ao  normal...
a  minha  relação  com  o  grupo  voltou  a  ser  a  mesma...

as  crianças...  em  geral...  não  guardam  muitos  rancores...
brigam  um  dia...  no  outro  já  está  tudo  bem...

essa  capacidade  de  esquecer  a  briga...
de  perdoar...
a  capacidade  de  saber  dizer...  "bola  pra  frente"...
essa  capacidade  do  ser  humano...
considero  muito  boa...

até  a  próxima...?
até  a  próxima...

quero  dar  um  abraço  muito  apertado...
em  vocês  dois...  meus  filhos...
com  carinho...
seu  pai...
               ...luis antonio...

...3.1... taue's reply...

Oi pai:



Só você mesmo.....



Achei muito engraçado : " esta´ cientificamente  provado  que...

 depois  que  a  poeira  atinge  tres  centimetros  de  altura...
 nao  precisa  mais  limpar...
 pois...  esta´ provado...
 que...  depois  dos  tres  centimetros...
 e´  impossivel  acumular  mais  poeira..."

...vc, e suas filosofias.(hahaha)

Mas eu adoro essas histórias suas continua mandando, e eu vou gravar todas elas num arquivo pra daqui a trinta anos mostrar pra Evy.

O texto do coração foi bastante interessante tambem , mas meio sacau.

Eu tava lendo o jornal hoje (leio todo dia de segunda a sexta no meu lunche) , e como não leio tudo (só mais ou menos o que me entereça) , vi um artigo de uma pessoa falando que todos os dias da sua vida é um bom dia...você acorda e vê a luz do dia , isso já é um bom dia, você respira o ar , isso é um bom dia...no final ele diz que a gente reclama muito da vida sem dar valor a ela  , porque a vida é muito curta. Um  dia você ta aqui na boa e no outro vc ta morto... então aproveita o maximo possivel!

Mas é isso pai, com certeza não puxei você. Não tenho muita paciencia pra escrever.

Abraços....Tauê.

...3.2... leitura no lunch-time...

querido  filho  tauê...

é...  você  já  havia  comentado  comigo...  antes...
que  você  gosta  de  ler  o  jornal  enquanto  come  seu  sanduichezinho...
na  hora  do  almoço...

isso  é  muito  bom...  meu  filho...
é  um  momento...  onde  você  pode  se  desligar  de  tudo...
se  desligar  das  preocupações...
e...  simplesmente  saborear  seu  lanche...
se  distraindo...  lendo  os  artigos  do  jornal  que  lhe  interessam...

achei  muito  sábio  o  artigo  que  você  "recortou"  para  mim...

..."vi um artigo de uma pessoa falando
que todos os dias da sua vida é um bom dia...
você acorda e vê a luz do dia , isso já é um bom dia,
você respira o ar , isso é um bom dia...
no final ele diz que a gente reclama muito da vida sem dar valor a ela,
porque a vida é muito curta.
Um  dia você ta aqui na boa e no outro vc ta morto...
então aproveita o maximo possivel!..."

também  gosto  desse  tipo  de  sabedoria...
realmente...  normalmente  muitos  de  nós  esquecemos...
de  dar  o  devido  valor  a  certas  coisas  básicas...
como...  por  exemplo  a  capacidade  de  ter  uma  visão  normal...
poder  ver  as  coisas...

já  pensou  para  um  cego...
poder  derrepentemente  poder  enxergar  normalmente...?
podemos  imaginar  um  premio  melhor  do  que  esse...?

ou...  uma  pessoa  que  tem  problemas  crônicos  respiratórios...
poder...  de repente  ficar  boa...  e...
poder  respirar  o  ar  puro...  normalmente...?

gostei  muito  desse  artigo  de  jornal...

você  escreve  bem...
graças  ao  seu  email...
fiquei  pensando  nisso  tudo  que  você  escreveu...

não  só  sobre  o  artigo  que  você  comentou...
a  beleza...  a  sabedoria  do  artigo...
como  também...
a  sua  sensibilidade...
de  poder  perceber...  que  aquele  artigo  era  especial...
que  aquele  artigo  trazia  uma  mensagem  de  sabedoria...

eu...  ao  ler  seu  email...
fiquei  contente...
fiquei  contente  de  confirmar  o  que  eu  já  sabia...
que  você...  tauê...  e´ um  cara  bom...
um  cara  tranquilo...
simples...
que  quer  ter  apenas  sua  paz...
encontrar  seu  cantinho  no  mundo...
sem  perturbar  ninguém...
sem  ser  perturbado...

poder  ler  seu  jornalzinho...  no  lunch-break...
poder  saborear  um  artigo  do  jornal...
onde  existe  uma  mensagem  que  revela  um  olhar  sobre  a  vida...
um  olhar  puro...  de  paz...  de  sabedoria...
de  agradecimento...  por  podermos  ter  uma  saúde...
que  nos  possibilita  ver  as  cores...
respirar  o  ar  da  manhã...

é  isso  aí  meu  filho...
dessa  vida...  não  levamos  muita  coisa...  não...
deixamos  apenas  na  memória  nessa  "meia-dúzia"...
de  três  ou  quatro  pessoas  que  verdadeiramente  nos  querem  bem...
deixamos  apenas  nosso  carinho...
nossas  palavras  de  ternura  e  amizade...

e...  nada  muito  além  disso...

o  sol...  como  todas  as  estrelas  do  universo...
vai  chegar  um  dia  em  que  ele  vai  se  apagar...
(pois  o  combustível  que  ele  queima...  não  é  infinito...)
(vai  ser  daqui  a  uns  bilhões  de  anos...
 os  cientistas  já  calcularam...)

quando  esse  dia  chegar...
o  nosso  querido  planeta  Terra...
vai  virar  uma  pedra  de  gelo...
(já  que  não  existe  mais  sol  para  aquece-la...)

e...  portanto...  não  haverá  uma  viva  alma  aqui...
nem  sequer  para  contar  a  história  da  humanidade...

portanto...  o  artigo  do  jornal  faz  muito  sentido...
vamos  agradecer  cada  dia  ao  amanhecer  por  estarmos  vivos...
por  podermos  abrir  os  olhos  e  enxergar  a  luz  do  dia...
por  podermos  respirar  fundo...  e  sentir  o  ar  puro  da  manhã...

e...  nos  relacionarmos  com  as  pessoas  que  nos  rodeiam...
de  uma  forma  mais  gentil  e  verdadeira  possível...
para...  quando  partirmos  para  uma  outra  dimensão...
sabermos  que  deixamos  aqui  na  Terra...
apenas  saudade...
em  todos  que  nos  querem...  verdadeiramente  bem...

até  já...  meu  filho...
continua  assim...
você  está  percebendo  o  que  é  realmente  importante  na  vida...
é  a  pureza  de  espirito...
a  paz  de  consciência...
saber  que  você  é  gentil  e  bom  para  com  todos...

em  resumo  um  homem  bom...
uma  pessoa  com  bom-coração...

estou  feliz  de  saber  que  você  é  assim...
pois  eu  também  sou  assim...
e...  graças  a  isso...
sinto  que  Deus  me  protege...

e...  naturalmente  continuará  te  protegendo  também...
por  que...?
porque  você  é uma  pessoa  de  bom-coração...

até  já...
obrigado  pelo  seu  email...
foi  muito  bom...

um  abraço...
apertado...
seu  pai...
               ...luis antonio...

...4... filosofando part four... ( 4 out of 18 )


querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

estávamos  no  rio  de  janeiro  aos  oito  anos  de  idade...
ia  pra  escola  de  bonde...
levando  minha  irmã  clarice  de  quatro  anos  de  idade...
na  volta...  preferia  voltar  a  pé...
pois  gastava  o  dinheiro  da  passagem...  na  pipoca...

a  vida  com  a  turminha  da  rua...
era  muito  boa...

morávamos  perto  da  pracinha  do  jockey club do brasil...
onde  a  turma  do  dinheiro...  ia  se  divertir...
apostando  na  corrida-de-cavalos...
um  dia...  um  dos  garotos  da  turma...
inventou  de  agente  se  reunir  para  organizar...
de  todo  mundo  passar  o  domingo  do  "grande-premio-brasil"...
cada  um  com  uma  flanela  na  mão...  cuidando  dos  carros...
do  pessoal  que  ia  jogar  nas  apostas...

foi  a  primeira  vez  que  trabalhei  na  minha  vida...
se  é  que  se  pode  chamar  isso  de  trabalho...
os  carros  iam  chegando  por  volta  do  meio-dia...
estacionavam  na  rua  lá  de  casa...
na  praça...  e...  a gente  ajudava  os  carros  a  entrar  na  vaga...
tipo  aqueles  flanelinhas...

no  final  do  "grande-premio-brasil"...
é  que  era  a  hora  da  atividade...
tínhamos  que  ir  de  carro  em  carro...
tentando  pegar  a  gorjeta...
eram  tantos...  ao  mesmo  tempo...
que...  muitos  escapavam...
era  como  se  fosse  numa  saída  de  cinema...
naquele  determinado  instante  "X"...
todos  saiam  ao  mesmo  tempo...

acabou  que...
juntamos  a  grana  que  todos  nós  arrecadamos...
e...  compramos  uma  bola-de-couro   "G.18"...
me  lembro  até  hoje  do  modelo  da  bola...  "G.18"...

---   ---   ---

aos  10  anos  de  idade...
minha  família  se  muda  de  volta  para  o  recife...

desta  vez...  ficamos  morando  na  casa  do  meu  avô...
pai  do  meu  pai...

só  que  ele  havia  falecido...  há  pouco  tempo...
e...  foi  a  primeira  (e  única)  vez  que  vi  meu  pai  chorar...
chorava  em  voz  alta...
falando...
"isso  é  terrível..."
"isso  é  terrível..."
e...  minha  mãe  lhe  consolava...

uma  cena  de  carinho...
de  amor  entre  meu  pai...  e  minha  mãe...
coisa  rara...
pois...  o  normal...  era  vê-los  brigando...  quase  o  tempo  todo...
por  besteirinhas  do  tipo...
"você  deixou  a  janela  aberta..."
(meu  pai  reclamando  da  minha  mãe...
 quando  ele  chegava  do  trabalho...
  normalmente...  cansado  e  mal-humorado...)
"você  estava...  provavelmente  lendo  o  "Time-magazine"..."
(ele...  reclamando  do  fato  de  ela...  (segundo  ele...)...
 passar  o  dia  lendo  a  revista  "Time"...)...

---   ---   ---

meu  avô  havia  falecido  recentemente...
e...  logo  depois...  minha  avó...  também...

eles  moravam  em  recife...
numa  casa  bem  grande...
com  um  quintal  enorme...
cheio  de  árvores...
numa  rua  chamada  rua  amélia...

como  meus  avós  haviam  falecido...
a  casa  ficou  meio  vazia...
quem  morava...  temporariamente  lá ...
era  uma  prima  minha  chamada  mariana...
que  morava...  também  temporariamente...  com  uma  irmã  da  minha  avó...
que  se  chamava  tia lurdes...

então...  meus  pais  resolveram  se  mudar  do  rio  de  janeiro...
de  volta  para  recife...
pois...  como  a  casa  de  meus  avós  estava...  praticamente  vazia...
nos  poderíamos  morar  lá...

neste  ponto...  aconteceu  uma  coisa  interessante...
eu...  tive  que  ir  pra  recife...  antes  da  minha  família...
pois  eu  tinha  uma  prova  de  admissão...
(para  poder  entrar  no  colégio )...numa  data...
que  era  uns  dois  meses  anterior  à  mudança  da  família  para  lá...

foi  aí ...  que...  pela  primeira  vez  na  minha  vida...
eu  viajei  de  avião...
e...  além  disso...  sozinho...  com  dez  anos  de  idade...
indo  do  rio  para  recife...
(mas  meu  pai  encontrou  um  amigo...  que  ia  no  mesmo  voo  que  eu...
  e  pediu  para  que  ele  me  acompanhasse  durante  o  voo...)

ao  desembarcar  no  aeroporto  em  recife...
estavam  lá  me  esperando...  meu  tio  marcos  (irmão  de  meu  pai...
que  se  tornou  politico..  chegou  a  ser  senador...) ...
e  sua  esposa  carolina...

a  partir  daí...  recomeçou  uma  fase  na  minha  vida...  totalmente  nova...
eu...  na  rua  amélia...  na  companhia  da  minha  prima  mariana...
... da  minha  avó...  e  de  sua  irmã  (tia lurdes)...

a  vida  delas  era  assistir  novela...
pela  primeira  vez  na  minha  vida...
entrei  no  mundo  das  novelas...
estórias  fictícias...  estórias  virtuais...
mas  que  me  puseram  em  contato  com  uma  "realidade"  da  vida...

e...  mais  tarde  pude  perceber  que...
muitos  desses  dramas  das  novelas...
podem  de  fato  acontecer...  na  vida  real...

ficamos  por  aqui...?
ficamos  por  aqui...

super-abraço  em  vocês  dois...?
super-abraço  em  vocês  dois...

até  já....
com  carinho...
seu  pai...
               ...luis antonio...

...5... filosofando part five... ( 5 out of 18 )...



querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

estávamos  em  recife  aos  dez  anos  de  idade...
vendo  novela  com  minha  prima  mariana...
(que  na  época  tinha  18  anos  de  idade...)
e  a  irmã  de  minha  avó...  tia  lurdes...
e  a  minha  avó...  mãe  do  meu  pai...
que  estava  até  bem  de  saúde...
(ela  veio  a  falecer  dentro  de  uns  dois  ou  três  anos  depois...)

eu  estava  lá  sozinho  com  elas...
pois...  conforme  havia  dito  no  email  anterior...
eu  viajei  do  rio  para  recife  antes  dos  meus  pais  e  dos  meus  irmãos...
já  que  eu  tinha  que  fazer  a  prova  de  admissão  ao  colégio...
numa  data  anterior  a  que  meus  pais  haviam  previsto...
para  a  mudança  deles  do  rio  para  recife...

para  mim...  aquela  época...  era  interessante...
no  sentido  de  eu  me  encontrar...  pela  primeira  vez  na  minha  vida...
distante  dos  meus  irmãos  e  dos  meus  pais...

encontrava-me  com  duas  velhinhas
(minha  avó...  e  sua  irmã...  tia  lurdes...)
numa  casa  com  um  astral  super- bom...  tranquilo...
aquele  astral  bom  do  nordeste...  diferente  do  rio de janeiro...
uma  casa...  onde  tudo  funcionava  sem  stress...

não  havia  mais  aquelas  infinitas  discussões...
entre  meu  pai  e  minha  mãe...
não  havia  mais  aquela  monotonia  do  rio de janeiro...
...aqueles  ambientes  cheios  de  concreto...  de  apartamentos...
...aquela  falta  total  de  chão-de-terra...  de  árvores...

em  contraste...  ali  na  casa  da  minha  avó...
é  como  se  eu  estivesse  num  paraíso...
a  casa  se  encontrava  no  meio  de  um  terreno  enorme...
cheio  de  árvores...  e...  eu  ficava  o  dia  inteiro  sem  fazer  nada...
trepado  em  cima  das  árvores...
principalmente  em  cima  do  pé-de-jambo...

nessa  idade...  (dez  anos)...  tudo  que  uma  criança
(acostumada  a  viver  num  apartamento)  quer...
é  poder  curtir  uma  natureza...  subir  em  árvores...
andar  com  os  pés  descalços  no  chão...

e...  o  mais  interessante  é  que  não  eram  árvores  na  rua...
num  lugar  público...  onde  todo  mundo  podia  passar...
as  árvores  se  encontravam  dentro  da  casa  da  minha  avó...
uma  casa  dela...  não  era um  lugar  publico...
era  com  se  fosse  um  paraíso  particular  inserido  no  mundo...
mas...  ao  mesmo  tempo  com  uma  total  privacidade...
protegido  por  um  muro  (baixo)  que  delineava  a  fronteira...
entre  aquele  "santuário"  privado...
e  a confusão  do  mundo  lá  fora...
onde  já  existia  trânsito...  poluição...  baixo-astral   etc...
coisas  que...  hoje  em  dia...  todos  nós  já  estamos  acostumados...

e  o  terreno  era  simplesmente...  enorme...
algo  gigantesco  mesmo...
eu  curtia  cada  árvore...
como  se  fossem  seres  vivos...  ( e...  de  fato...  são...)
subia  em  seus  galhos...  conquistando  cada  região  de  seu  interior...
a  meta  era  sempre  atingir  os  galhos  mais  altos...

mas...  com  o  tempo...  aprendi...
que  cada  árvore  tinha  seu  segredo...
ela  gostava  que  eu  subisse  nela...
mas  a  subida...  tinha  seus  limites...
cada  árvore  tinha  seu  ponto  ideal  de  subida...
a  partir  daquele  ponto...
seus  galhos  iriam  se  afinar  cada  vez  mais...
e  a  queda  seria...  praticamente...  inevitável...

---   ---   ---

escrevia  para  meus  amigos  do  rio de janeiro...
contava  como  era  bom  subir  em  árvores...
eles  me  respondiam...  contando  como  foi  o  gol  do  flamengo...
com  direito  a  uma  explicação  ilustrada...
com  desenhos  feitos  por  eles  mesmos...
descrevendo  em  linha  pontilhada...
a  trajetória  da  bola  para  o  gol...

ao  ler  suas  cartas...  já  dava  para  começar  a  sentir......
como  eram  diferentes  os  universos...
entre  o  que  eu  realmente  gostava...
e  o  que  o  meu  amigo  gostava...

o  mundo  para  ele  era  o  futebol...
para  mim...  pouco  me  interessava  ver...
a  trajetória  da  bola  do  gol  do  flamengo...

o  que  realmente  me  fazia  feliz...
era  poder  curtir  a  harmonia...
eu  dentro  de  uma  árvore  enorme...  lá  em  cima...
sentindo  o  vento  balançar  seus  galhos...
curtindo  uma  felicidade  que  eu  jamais  havia  curtido  em  minha  vida...
a  felicidade  de  brincar  num  quintal  daqueles...
com  os  pés  descalços...
na  paz  da  casa  da  minha  avó...

---   ---   ---

a  noite...  depois  daquela  sopinha  de  feijão  com  tiras  de  macarrão...
e  com  aquele  gostinho  de  coentro... (um  tempero  típico  do  nordeste...)
a  televisão  com  minha  prima...  minha  avó  e  sua  irmã...  tia  lurdes...

tia  lurdes  tinha  quebrado  o  tornozelo...
foi  no  ponto-de-ônibus...
o  ônibus  arrancou...  imprensando  seu  tornozelo...
entre  a  roda-do-ônibus  e  o  meio-fio...
ela  passava  o  dia  sentada...
na  frente  da  televisão...
com  a  perna  engessada...

às  vezes  chorava...
um  dia  quando  estava  chorando...
minha  prima  mariana  chegou  perto  dela...
e  lhe  abraçou..  lhe  abraçou  com  carinho...
lhe  confortando...

essa  cena  ficou  na  minha  memória...
achei  muito  bonita  a  cena  de  uma  pessoa  confortando  a  outra...
em  seu  sofrimento...
eu  não  estava  acostumado  a  ver  cenas  desse  tipo...
meus  pais  não  tinham  o  hábito  de  se  abraçar...
meus  irmãos  também...  não...
portanto...
essa  cena  foi  como  se  fosse  uma  espécie  de  novidade  para  mim...

---   ---   ---

eu  tinha  dez  anos  de  idade...
minha  prima...  dezoito...
um  dia  ela  me  chamou  para  sair  com  ela...
e  com  o  namorado  dela...  o  eric...
que  tinha  o  hábito  de  sair  com  ela...
num  certo  dia  de  semana...  à  noite...

ele  foi  nos  apanhar  em  casa...  com  seu  fusquinha  nota-dez...
brilhando...
ele  também  todo  limpinho  de  banho-tomado...
a  barba  super-bem-feita...  com  um  certo  perfume...
pronto  para  namorar...

ao  entrarmos  no  carro  dele...
ele  dirigindo...
minha  prima  no  banco  do  co-piloto...
e  eu  no  banco-de-trás...

depois  de  uns  trinta-segundos..
após  estarmos  todos  acomodados  em  nossos  devidos  acentos...
e  o  carro  já  em  movimento  na  rua...
o  eric  chega  pra  minha  prima...  e  diz...
"ué ...  estou  te  estranhando..."
neste  ponto  ela  vai  e  dá  maior  beijo  nele  tipo  "chupão..."

eu...  que  não  estava  acostumado  a  ver  tais  cenas...
para  mim...
foi  como  se  fosse  uma  espécie  de  "choque"...  no  bom-sentido...
fiquei  imaginando  que  ela  não  tinha  ido  logo  beijá-lo...
(como  de  costume...)
por  causa  da  minha  presença...
mas...  depois  que  ele  deu  o  toque...("estou  te  estranhando...")
ela  perdeu  a  inibição...
e  agiu  normalmente...  como  de  hábito...

imediatamente  percebi...  como  deve  ser  gostoso  namorar...

---   ---   ---

dias  depois...  minha  família...  meus  pais...  meus  irmãos...
chegam  do  rio de janeiro...
vida  nova...
minha  velha  família...
no  paraíso-novo  da  casa-de-minha-avó...

cheia  de  árvores...

mas  minha  família...  não  estava  muito  interessada  em  árvores...
a  obsessão  do  meu  pai...
era  a  de  poder  transformar  minha  irmã  ana emilia...
numa  nova  recordista-mundial  de  natação...

ficamos  por  aqui...?
ficamos  por  aqui...

aquele  abraço  em  vocês  dois...
com  muito  carinho...
seu  pai...
               ...luis antonio...


...5.1... peter's reply...

Recebi filosofando part 4..
Quero saber mais do treino de sua irma para se tornar em recordista mundial de natacao.
um abraco,
Peter

...6... filosofando part six... ( 6 out of 18 )


querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

minha  família  tinha  chegado  em  recife...
na  rua  amélia...
a  casa...  cheia  de  árvores...  dos  meus  avós...

junto  com  a  família...  veio  a  mania  do  meu  pai...
de  adorar  a  natação...

assim  que  chegou  em  recife...
uma  das  primeiras  coisas  que  ele  fez...
foi  colocar  eu  e  a  ana emilia  na  natação...
do  clube  português...
um  clube  que  ficava  a  cerca  de  um  quilômetro  lá  de  casa...

então...  tudo  mudou  na  minha  vida...
o  enfoque  não  estava  mais  direcionado  às  árvores...
eu  tinha  que  ir  para  o  colégio  de  manhã...
e...  à  tarde  para  o  clube  português...
para  praticar  natação...

a  vida  continuava  tranquila...
apesar  das  atividades...

nadar  no  nordeste...
era  bem  mais  prazeroso  do  que  nadar  no  rio de janeiro...
a  água  do  rio...  era  bem  mais  gelada...
em  recife...  era  aquela  água  gostosa...
e...  nos  dias  quentes...
a  natação  torna-se  até  um  prazer...

minha  irmã  ana emilia...
já  estava  dando  sinais  de  que  ela  tinha  um  bom  potencial...
para  ser  uma  espécie  de  campeã  de  natação...
essa  mania  de  natação  que  meu  pai  nos  envolveu  já  era  antiga...
antes  mesmo  de  irmos  para  recife...  ainda  no  rio...
eu  e  a  ana emília  já  nadávamos  no  botafogo...

e...  desde  aquela  época...
me  lembro  bem  do  primeiro  dia  em  que  meu  pai  nos  levou  lá...
no  botafogo  para  nos  apresentar  ao  técnico  de  natação...

tinham  dois  técnicos...
um  era  o  técnico  argentino...  que  se  chamava  "Carranza"...
e...  o  outro  era  o  técnico  dos  nadadores  de  segunda-linha...
(que  não  tinham  muito  futuro...  em  termos  de  campeonato...)
esse  técnico  dos  iniciantes  se  chamava..."Rui"...

Aí  meu  pai  me  levou  junto  com  minha  irmã...  lá  no  botafogo...
fala  com  o  técnico  Carranza...
eu  e  minha  irmã...  caímos  na  piscina...
demos  uma  nadadinha  para  o  técnico  nos  avaliar...

e...  ai´ o  técnico  Carranza  fala  pro  meu  pai...
..."é  obvio...  ela...(ana emilia )...  fica  comigo"...

e...  neste  ponto  ficou  uma  dúvida...  naturalmente...  parada  no  ar...
"...  e...  quanto  a  ele...?"...  alguém  perguntou...

ai´ o  Carranza  responde...
ele...  (é  obvio...)  vai  pro  Rui...

---   ---   ---

ficou  aquela  coisa  meio  estranha  no  ar...
porque...  afinal...
qual  era  a  diferença  fundamental  entre  eu  e  minha  irmã...?

talvez  porque  eu  tinha  um  par  de   pernas  finas  demais...?

não  sei...
a  coisa  foi  colocada  de  uma  forma...  como  se  não  houvesse  dúvidas...
"a  ana emilia...  obviamente...  vai  ser  minha  aluna...
  mas  esse  (ratinho  ai´...)...  é  óbvio....  vai  pro  Rui..."

nada  disso  foi  dito...  é  claro...
mas...  o  jeito  com  que  ele  falou...
"ele...?  ...  vai  pro  Rui..."

o  jeito  com  que  ele  falou...  foi  mais  ou  menos  significando  isso...
que  eu  ...  obviamente  não  tinha  as  condições  físicas...
necessárias  para  me  tornar  um  campeão...
seria  uma  "burrice"...
um  desperdício  pensar  que  eu  poderia  ser  um  dia  campeão...

mas...  eu  não  levei  nada  disso  muito  a  sério...
fui  pro  Rui...
minha  irmã  foi  pro  Carranza...

treinávamos  todos  os  dias...
ainda  no  rio...  no  botafogo... antes...
um  ou  dois  anos  antes  de  nos  mudarmos  para  recife...
um  frio  danado...
era  meio  tortura  termos  que  enfrentar  esse  frio...
principalmente  nas  horas  do  "tiro"...
onde  nadávamos  a  piscina  de  25  metros...  dando  o  máximo  de  velocidade...
depois  saiamos  da  piscina  para  entrar  na  fila...
para  nadar  novamente  mais  um  tiro  de  25...
saía  d´água...  entrava  na  fila... etc...
nessa  de  sair  da  água  e  entrar  na  fila  é  que  batia  o  frio  brabo...
por  causa  do  vento...

então...  deslocando  essa  estória  da  piscina  gelada  do  botafogo...
no  rio  de  janeiro...
para  a  piscina  do  clube  português  em  recife...
com  aquela  temperatura  super- agradável...
que  só  uma  piscina  numa  região  de  muito  calor  como  o  nordeste...
pode  oferecer...  ah...  então  valeu...
a  natação  no  recife  era  algo  bom...  era  algo  prazeroso...

---   ---   ---

minha  mãe  resolve  comprar  um  piano  usado...
coloca  lá  na  casa  da  rua  amélia...
me  ensinou  a  tocar  uma  música  italiana...
curti...  de  montão...

aos  sábados  à  tarde  tinha  umas  festinhas  de  dança  no  clube  português...
agente  ia  lá ...  dançava...  com  as  outras  pessoas  da  natação...
era  legal...

um  dia...  uma  garota  começou  a  me  beijar...
meu  pai  viu  e  me  deu  uma  bronca...
(fiquei  meio  sem  graça...)

anos  mais  tarde...  quando  meu  pai  já  estava  fazendo  psico-terapia...
ele  me  pedia  que  eu  contasse  cenas  do  passado  entre  eu  e  ele...
quando  contei  o  lance  do  clube  português...
ele ...  apesar  de  não  se  lembrar  do  lance...
ficou  super- surpreso  consigo  próprio...
sem  entender  porque  ele  teria  dado  aquela  bronca...
(como  se  tivesse  feito  uma  burrice  danada...)

a  minha  relação  com  meu  pai...  não  era  muito  frequente...
a gente  não  se  encontrava  muitas  vezes...
isso  era  devido  ao  fato  de  ele  trabalhar  muito...
estava  sempre  trabalhando  de  montão...
e...  quando  chegava  em  casa...
normalmente...  estava  cansado...

já  com  minha  mãe  era  diferente...
durante  toda  a  minha  vida...
sempre  tive  muito  papo  com  ela...

ela...  além  de  contar  estórias...
sabia  ensinar  de  uma  maneira  que  não  dava  mais  para  esquecer...

me  ensinou  a  matemática  básica...
como  resolver  problemas  de  matemática...
português...  geografia...  inglês...
sentava  comigo  em  frente  a  um  toca-discos...
e  escutávamos  o  disco  dos  beatles...
onde  ela  ia  traduzindo  para  mim...
o  significado  das  canções...

o  disco  era  o  sargent  pepper´s  lonely  heart  club  band...
eu  ia  lendo  a  letra  impressa  no  verso  da  capa  do  "long-play"...
(em  inglês)...
e  ela  ia  me  explicando  o  significado  em  português...

na  música...  "a  day  in  the  life..."
onde  eles  cantam...

I read the news today oh boy
About a lucky man who made the grade
And though the news was rather sad
Well I just had to laugh...

ela  me  explicava  que  a  expressão  "made  the  grade"...
estava...  ali  naquele  contexto...  significando... "conseguiu  passar"...
no  sentido  de  "conseguiu  passar  para  a  outra  dimensão"...
ou  seja...  "morreu"...

e...  assim...  eu  ia  recebendo  dela...  todos  esses  ensinamentos...
de  uma  forma  tranquila...
aprendendo...  não  só o  inglês...
mas  várias  outras  matérias...

depois  que  recebia  esse  empurrão  inicial  dela...
a  partir  daí...  eu  ia  aprendendo  por  mim  mesmo...

desta  forma...  passei  a  sentir  prazer  ao  estudar...
tomei  gosto  pelos  estudos...

mesmo  porque...  percebi...
que  o  estudo...  é  como  se  fosse  uma  chave...
que  dá  acesso  a  novos  horizontes...

por  exemplo...
atualmente...  domino  bem  o  português...  e  o  inglês...

mas...  se  algum  dia...  eu  quiser  ir...  por  exemplo...  à  europa...
ou  alguma  ilha  colonizada  pelos  franceses...
se...  eu  me  antecipar...  e  começar  a  estudar  o  francês...  desde  já...
esse  conhecimento...  me  daria  condições...
de  me  comunicar  com  pessoas  desses  países  que  só  sabem  o  francês...
(por  exemplo)...

em  outras  palavras...  o  conhecimento  nos  permite  acessar  pessoas...
lugares...  de  uma  forma  bem  mais  plena...
de  uma  forma  bem  mais  profunda...

mas  isso  não  quer  dizer  que  possamos  saber...
todos  os  conhecimentos  do  mundo...
isso...  obviamente  é  impossível...

mas...  com  a  ajuda  da  minha  mãe...
comecei  a  sentir  gosto  pelos  estudos...
comecei  a  sentir...  que  eu  era  capaz  de  pegar  um  livro...
lê-lo..  entende-lo...e  curtir  os  ensinamentos  apreendidos  no  livro...

com  o  tempo...  percebi...  também...  que  nem  todos  os  livros  são  bons...
é  preciso  saber  escolher...  o  que  vale  a  pena  investir  a  atenção...
e  o  que  não  merece  nossa  atenção...

vou  parando  por  aqui...
deixando...  desde  já  um...
enorme...  enormessíssimo...
bem  apertado...
super-abraço...
em  vocês  dois...

até  já...
se  agasalhem  bastante...
que  o  frio  está  chegando...

um  grande  abraço...
seu  pai...
               ...luis antonio...

...6.1... taue's reply...

Oi pai:



Adorei sua carta, continua mandando, voce escreve muito bem....



Eu acho que voce tem muito sabedoria , um homem muito culto... tenho muito orgulhor disso.



Falo muito bem de voce pra todo mundo....Gostaria de ser um pai que nem voce pra Evy..



Abracos,



Taue.

...6.2... você já é...

querido  filho  tauê...

quando  você  disse...

" Falo muito bem de voce pra todo mundo....
  Gostaria de ser um pai que nem voce pra Evy "...

...devo  lhe  dizer  que  você  já  é  um  excelente  pai  para  a  Evy...

nas  duas  vezes  que  fui  em  Boston  te  visitar...
vi...  como  você  é  um  bom  pai...
como  você  é  um  bom  marido...
como  você  é  um  bom  amigo...
como  você  é  um  bom  trabalhador...
como  você  é  uma  pessoa  ótima...
para  consigo  próprio...
e...  para  com  todos  que  estão  a  sua  volta...

e...  com  relação  à  Evy...  você  é  um  paizão...
super- bom...
super- amoroso...
continua  assim...  meu  filho...

você  é  uma  pessoa  boa...
de  bom  coração...
e...  a  Evy  sente  isso  tudo...
e...  deve  te  adorar  por  você  ser  assim...

eu...  também...  tenho  muito  orgulho  de  você...
agradeço  muito  a  Deus...
de  ter  me  dado  essa  alegria...
ter  um  filho  como  você...

muito  obrigado  pela  sua  carta...
foi  muito  bonita...
me  emocionei...

até  já...
um  abraço  apertado...
seu  pai...
              ...luis antonio...

...7... filosofando part seven... ( 7 out of 18 )...

...querido  filho  tauê...
...querido  filho  peter...

ao  descrever...  no  último  email...
o  quanto  eu  agradeço  à  minha  mãe...
por  ter  tido  o carinho  e  a  habilidade...
de  me  motivar  a  ter  gosto  pelos  estudos...

ao  descrever  isso...  ficou  faltando  dizer...  que...
nesse  processo  de  "tomar  gosto  pelos  estudos"...
existe  uma  fase  de  transição...  uma  fase  meio  "dolorosa"...
uma  fase  onde a  criança  sofre...
ao  perceber  que  é  difícil  se  conformar  em  aceitar...
a  ideia  de  abrir- mão  da  vida  inocente-infantil...
e  partir  para  uma  vida  mais  "dolorosa"...
típica  das  primeiras  fases  do  aprendizado...

essa  transição  se  deu  justamente  naquela  época...
aos  dez  anos  de  idade...  na  rua  amélia...
onde  eu  estava  curtindo  muito...
poder  andar  com  os  pés  descalços  na  terra...
no  meio  das  arvores  da  casa  de  minha  avó...
(em  contra- posição  àquela  vida  dentro  de  um  apartamento...
 na  época  do  rio de janeiro...)

meus  pais  e  meus  irmãos  tinham  chegado  do  rio  para  a  rua  amélia...
em  recife...
bem  no  meio  das  férias  grandes  de  verão...
(ou  seja... dezembro,  janeiro,  fevereiro...
 já  que  o  verão  aqui  no  hemisfério-sul...
 acontece  no  período  oposto  aí  do  hemisfério  norte...)

como  eles  tinham  chegado  bem  no  meio  das  férias  de  verão...
e...  como  minha  mãe  viu  que  eu  ficava  o  dia  inteiro  sem  fazer  nada...
resolveu  me  botar  para  estudar...  nas  férias...

falou  que  era  para  eu  sentar  na  mesa  da  sala...
me  deu  um  caderno...  lápis  e  borracha...
e  disse  que  era  para  eu...  todos  os  dias...
fazer  uns  cinquenta  ou  setenta  exercícios  de  matemática...
de  um  livro  de  matemática...  chamado  "Ary Quintella"...
(que  era  o  nome  do  autor...)

...  nao  acreditei  no  que  estava  acontecendo...
eu...?...  passar  minhas  ferias  estudando  aquelas  drogas  de  exercícios...?
pô...  que  tortura....   que  ideia  mais  maluca...

sentei  naquela  cadeira  em  frente  daquele  caderno...  daquele  livro...
me  deu  um  "mal-estar"...
uma  vontade  de  reclamar...
por  que  logo  eu... ?
ter  que  estudar...?
logo  nas  férias...?

minha  mãe  notou  o  meu  desespero...
e...  tranquilamente...  pegou  o  rascunho...
e...  começou  a  me  explicar  os  exercícios...
e...  a  partir  dessa  explicação...
vi  que  eu  tinha  condições  de  ir  fazendo  os  outros  exercícios...

então...  o  que  antes  parecia  uma  tortura...
passou  a  ser  uma  coisa  boa...  um  prazer...

comecei  a  fazer  os  outros  exercícios...
como  se  fosse  uma  atividade  boa...  um  jogo...  uma  diversão...

em  resumo...  essa  é  a  magica  do  prazer-de-estudar...
depois  que  o  aluno  recebe  um  "empurrãozinho"  de  alguém...
depois  disso...  o  estudante  percebe...
que  é  capaz  de  caminhar-com-as-próprias-pernas...

e...  essa  sensação  de  independência...
lhe  dá  um  bem-estar...
uma  vontade  de  continuar  caminhando...
se  desenvolvendo...

---   ---   ---

naquela  época  o  ensino  brasileiro  se  dividia  em  três  etapas...
1...  o  primário...  dos   6   aos   10  anos  de  idade
2...  o  ginásio....   dos 11  aos   14  anos...
3...  o  científico...  dos  15  aos  17  anos...

normalmente...  aos  18  anos...  a  pessoa  estava  tentando...
fazer  a  prova  do  vestibular...  para  tentar  entrar  pra  faculdade...

como  se  tratava  de  uma  prova  muito  difícil...
normalmente  os  alunos  se  matriculavam  nos  famosos  "cursinhos"...
que  eram  pequenas  escolas  avulsas...
especializadas  em  preparar  o  pessoal  para  o  vestibular...

---   ---   ---

muito  bem...
mas...  por  que  é  que  estou  falando  sobre  isso  tudo...?

porque  naquela  época...  como  eu  tinha  dez  anos  de  idade...
eu  estava  bem  na  fronteira  entre  o  primário  e  o  ginásio...

dependendo  do  nível  da  escola  ginasial  que  o  aluno  pretendia  ingressar...
dependendo  da  escola...
se  a  escola  fosse  "puxada"...  com   um  nível  de  ensino  bom...
ela  exigia  do  aluno  que  estava  querendo  entrar  la´...
que  ele  se  submetesse  a  um  exame  de  admissão...
que...  normalmente...  era  difícil...

(é  como  se  fosse  uma  espécie  de  vestibularzinho...
 só  que  do  primário  para  o  ginásio...
 ao  invés  do  científico  para  a  faculdade...)

então...  um  dia  vi  uns  garotos  passando  na  rua  com  um  uniforme...
pareciam  fantasiados  de  soldadinhos...
com  aquele  uniforme  cor  marrom-claro...
duas  listras  verticais  vermelhas  acompanhando  a  calca-comprida...
e  aquele  chapeuzinho  vermelho....
o  famoso  "cap"  tipo  aquelas  aeromoças...
só  que  vermelho...  combinando  com  as  listras  vermelhas  da  calça...

achei  aquilo  o  máximo...
crianças...
fantasiadas  de  soldadinhos  de  verdade...

perguntei  a  minha  mãe  que  uniforme  era  aquele...
ela  me  explicou  que  era  dos  alunos  do  colégio-militar...
uma  escola  boa...  com  um  ensino  bom...

perguntou  se  eu  gostaria  de  tentar  fazer  a  prova de  admissão  para  lá...

disse  que  sim...
bastante  contente  de  saber  que  eu  iria  entrar  numa  escola...
onde  o  uniforme  dos  alunos  era  igual  ao  dos  soldados  de  verdade...

e  assim  começou  uma  nova  trajetória  na  minha  vida...
onde...  mais  tarde...  passei  a  me  arrepender  muitíssimo...
dessa  (infeliz)  ideia  de  querer  entrar  para  uma  escola...
onde  os  alunos  se  fantasiavam  de  soldadinhos-de-chumbo...
com  o  "cap"  vermelho...

ficamos  por  aqui...
meus  queridos  filhos...

ficam  com  Deus...
tudo  de  bom...
super-abraço...
seu  pai...
               ...luis antonio...

...7.1... peter's reply...

recebi a parte 7.  Nao sabia que foi voce que se meteu nessa da escola militar.
Sempre pensei que foi seu pai que lhe obrigou a ir pra la.
Falaremos mais logo,
um abraco,
Peter

...8... filosofando part eight... ( 8 out of 18 )...


querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

pois  é...
nessa  de  achar  o  uniformezinho  bonitinho...
quem  se  deu  mal...  fui  eu...

entrei  na  maior  "canoa  furada"...
nunca  fiz  uma  burrice  tão  grande  na  minha  vida...

mas  só  percebi  isso...
quando  estava  mais  ou  menos  no  final  do  segundo-ano  ginasial...
(com  12  anos  de  idade...)
e  principalmente...  no  inicio  do  terceiro-ano...(com 13 anos...)

quando  eu  entrei  para  o  colégio  militar...
eu  ainda  morava  em  recife  (rua amélia)...
estudei  lá  apenas  na  primeira  metade  do  primeiro-ano...

em  julho...(ferias-de-inverno  daqui...)
nos  mudamos  de  volta  para  o  rio de janeiro...
mais  precisamente  para  ipanema...
para  um  apartamento  na  rua  prudente  de  morais...
(a  primeira  rua  paralela  à  rua  da  praia...)
um  apartamento...  que  meu  pai  acabara  de  comprar...

ao  chegarmos  no  rio...
a  minha  transferência  do  colégio  militar  do  recife...
para  o  colégio  militar  do  rio de janeiro...
era  do  tipo...  transferência-automática...
ou  seja...  eu  não  teria  que  fazer  o  tal  do  exame-de-admissão...
que...  para  os  colégios  militares  era  sempre  muito  difícil...

pois...  eu  já  havia  passado  no  exame-de-admissão  em  recife...
há  seis  meses  atrás...

essa  prova  de  admissão  era  tão  difícil...
que...  ainda  em  recife...
minha  mãe  havia  me  colocado  num  cursinho...
especializado  em  exames  de  admissão  para  o  colégio  militar...

então...  com  dez  anos  de  idade...
eu  já  estava  num  curso  especializado...
em  fazer  provas  para  o  exame  de  admissão...

em  outras  palavras...
desde  muito  cedo...  entrei  num  esquemão  de  muita  responsabilidade...
de  muita  disciplina...  de  muito  estudo...
de  muita  preocupação...

hoje  em  dia...  refletindo  sobre  tudo  isso..
vejo  que...  o  que  aconteceu  comigo...
(o  fato  de...  muito  cedo  carregar  muita  responsabilidade  nas  costas...)
apresenta  vantagens  e  desvantagens...

a  vantagem  é  que...  (apesar  de  muito  cedo)...
fui  me  preparando  academicamente...
estudando  muito...
o  que...  obviamente...  tem  suas  vantagens...

a  desvantagem  é  que...  uma  criança  de  dez  anos...
se  não  brincar...
acaba  descontando  essa  falta...
anos  mais  tarde...
mais  velho...

e...  possivelmente...  isso...  talvez...  tenha  acontecido  comigo...
quando  aos  quarenta-e-quatro  anos  de  idade...
no  hawaii...
fico  horas  e  horas  tocando  violão  nas  escadarias  da...
university  of  hawaii  at  manoa...

(tudo  bem...  bola  pra  frente...)

---   ---   ---

julho  de  1965...  onze  anos  de  idade...
o  primeiro  semestre  do  colégio  militar  de  recife...  já  feito...
tudo  pronto  para  nos  mudarmos  de  recife  de  volta  para  o  rio de janeiro...

para  se  despedir  de  recife...
meu  tio  marcos...  (irmão  do  meu  pai...)...  carolina...  e  filhos...
me  convidam  para  passar  uma  semana  com  eles  numa  casinha  de  pescadores...
que  eles  alugaram  em  rio-doce...
(uma  praia  afastada  da  cidade...
para  curtir  uma  semana  de  praia  numa  vilazinha  de  pescadores...
...(rio-doce)...
(que  hoje  em  dia  não  tem  mais  nada  a  ver...
com  aquela  vila-de-pescadores  de  antigamente...
passou  a  ser  um  bairro  super-populoso  de  olinda...
que  por  sua  vez...
pode  ser  considerada  como  uma  continuação  ininterrupta  de  recife...
tornando-se  tudo  uma  espécie  de  megalópole...)

anyway...  eles  alugaram  essa  cabaninha  de  praia...
e  me  convidaram  para  passar  minha  ultima  semana  de  recife  com  eles...
lá  em  rio-doce...
lá  fui  eu...
tranquilo...
um  astral  muito  legal...
uma  família  muito  unida...
muito  harmoniosa...
sempre  me  trataram  muito  bem...

à  noite...  aquele  céu  maravilhoso...
meu  tio...  (sempre  na  rede)...
comenta  comigo  como  aquelas  estrelas  eram  lindas...
já  que  não  havia  luz  elétrica...
e...  as  estrelas  ficam  ainda  mais  bonitas...
já  que  não  existe  iluminação  nos  postes-de-rua...

de  manhã  cedinho...
eu  gostava  de  acordar  cedo...
e  ir  tomar  um  banho-de-mar...
sozinho...  naquele  mar  infinito  do  nordeste...

levava  uma  prancha  de  isopor  tipo  morey-boogie...
que  eu  havia  ganhado  recentemente...
mas  nunca  tinha  usado...
(não  tinha  nunca  pego  nenhuma  onda  na  minha  vida...)
(nem  sabia  o  que  era  isso...)

como  aqui  no  nordeste  as  ondas  são...  em  geral...  muito  pequeninas...
eu  costumava  ir...  bem  cedinho...
e  ficava  curtindo  remar  em  cima  da  prancha...
deitado  em  cima  da  prancha...
remava...  naquela  água  bem  fresquinha  da  manhã...
explorando  aquelas  piscininhas  naturais...  etc...

nos  dois  últimos  dias...
o  mar  resolveu  me  presentear...
com  umas  marolinhas  ótimas...
que  poderiam  nos  empurrar...(eu  e  a  prancha)...por  uns  vinte  metros...

a  primeira  onda  foi  inacreditável...
que  maravilha...
sentir  a  onda  me  empurrando...  deitado  em  cima  da  prancha...
por  cerca  de  vinte  metros...  ou  mais...
que  sensação  divina...
que  prazer...
nunca  havia  sentido  nada  tão  bom...

aí  eu  curti  de  montão...
peguei  varias  ondas...
pegava  elas...  já  estouradas...
era  mais  fácil...
para  quem  nunca  tinha  pego...

na  areia...  conversei  com  um  moço...
(acho  que  era  algum  parente  ou  amigo  do  meu  tio...)
ao  comentar  com  ele  que  eu  tinha  adorado  poder  "pegar- jacaré..."
(que  era  o  nome  que  todo  mundo  dava  ao  surf  de  peito...
 ou  então...  ao  que  usa  pranchinhas  tipo  a  que  eu  estava  usando...)
o  moço  me  disse  que  no  rio de janeiro  eles  fazem  isso...
só  que...  em  pé...  em  cima  da  prancha...

falei  pra  ele...
"em  pé...  na  prancha...?"

e  ele  respondia...
"...é...  como  se  fosse  esquiando...
 eles  tem  uma  prancha  enorme...
 e  deslizam  na  onda  até  a  areia..."

fiquei  fascinado...

devia  ser  muito  bom  mesmo...
sem  dúvida...  eu  queria  ir  para  o  rio de janeiro...

queria  ver  de  perto...
as  pessoas  deslizando  em  pé...
sobre  as  ondas...
numa  prancha  enorme...

---   ---   ---

ficamos  por  aqui...?
acho  melhor...  sim...
pois  senão...  não  vai  sobrar  mais  nada  para  depois...

um  abraço  bem  apertado...
em  vocês  dois...

espero  que  a  saúde  esteja  boa...
ficam  com  Deus...

até  já...
um  grande  abraço...
seu  pai...
               ...luis antonio...