...12.2... respondendo à sua carta...


querido  filho  tauê...

gostei  muito  da  sua  carta...

esse  problema  da  minha  timidez...
naquela  época  em  que  eu  tinha  12  anos  de  idade...
em  relação  ao  grupo  de  amigos  e  amigas  do  vítorino...
era  uma  coisa  muito  intensa...  até  hoje...
não  sei  direito  explicar...
as  causas  que  me  levaram  a  ter  toda  aquela  timidez...

eu  acho  que...  no  meu  caso...  naquela  época...  em  teresópolis...
vários  fatores  contribuíram...
vou  tentar  descrever  pelo  menos...  um  deles...

aquele  grupo  de  amigos  e  amigas  do  vítorino...
era  constituído  por  um  tipo  de  pessoas...  com  os  quais...
eu  não  estava  muito  acostumado...

eram  pessoas  com  um  certo  nível  de  sofisticação...  que...  para  mim...
representava  algo  de  muito  novo...

 é...  como..  se...  de repente  eu  me  visse  diante...
de  um  mundo  completamente  novo  para  mim...

e...  essa  sensação  de  estar  num  mundo  diferente  daquele...
ao  qual  estamos  acostumados...
de  certa  forma...  representa  uma  ameaça  para  nós...

muitas  vezes...  nos  sentimos  ameaçados...
pois  temos  medo  de  que  o  grupo  nos  ache  ridículo...
temos  medo  de  que  o  grupo  nos  julgue...
temos  medo  de  que  o  grupo  caçoe  de  nós...

esse  grupo  nos  ameaça...
e...  essa  ameaça...  de  certa  forma...  nos  apavora..
instintivamente...  nos  retraímos...
evitamos  nos  expor...
optamos  por  falar  pouco...
que  é  uma  maneira  de  diminuirmos  as  chances  de...
sem  querer...  dar  uma  escorregada...  cometer  uma  "mancada"...
um  "furo"...  uma  "gaffe"...
e...  todo  mundo  rir  d’agente...

um  "riso"  que  pode  ser  explícito...  ou  não...
pode  ser  um  "riso"  invisível...

e....  esse  "riso"  invisível  é  o  que  nos  apavora  ainda  mais...
pois...  justamente  por  ser  invisível...
não  temos  o  controle  sobre  ele...
não  sabemos  se  ele  está...  realmente  lá...
ou  não...

ficamos  à  mercê  da  nossa  imaginação...
(que  alguns  chamam  de  "paranóia")...

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mas...  meu  querido  filho  tauê...
com  o  tempo...
na  medida  em  que  vamos  crescendo...
ficando  mais  velhos...
mais  maduros...

percebemos  que  todo  esse  temor...
todo  esse  medo...
é  desnecessário...

que  aquela  turma...
que  achávamos  que  era  formada  por  pessoas  finíssimas...
requintadíssimas...  sofisticadíssimas...

não  passam  de  pessoas  normais...
como  nós...
com  suas  qualidades  e  defeitos...

seres  humanos...  como  qualquer  outro...
que  cagam...  dormem...
ficam  doentes..
ficam  alegres...
ficam  tristes...
etc...  etc...

então...  percebemos...  que  toda  aquela  aflição...
que  tínhamos  em  relação  àquele  grupo  de  pessoas...
era  fruto  de  nossa  imaginação...

nós  pensávamos  que  éramos  seres  inferiores...
mas...  pensando  bem...
ninguém  é  melhor  nem  pior  do  que  o  outro...

somos  apenas  diferentes...

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na  medida  em  que...
tomamos  consciência  de  que  não  somos  piores  do  que  ninguém...
essa  consciência  nos  ajuda  a  melhorar  nossa  auto-estima...
ou  seja...  nosso  self-esteem...

historicamente...  na  minha  vida...
passei  por  vários  momentos...  na  minha  vida...
onde  meu  self-esteem  estava  meio  baixo...

noutras  fases...  da  minha  vida...
meu  self-esteem  estava  razoavelmente  alto...

atualmente...  graças  a  Deus...
meu  self-esteem...  até  que  anda  bem...

nunca  pensei  muito  nisso...  que  vou  escrever  agora...
mas...  conversando  com  você...  neste  momento...
através  desse  email...
me  surgiu  a  idéia  de  que...  talvez...
o  self-esteem  das  pessoas...  em  geral...
seja  consequência  de  vários  fatores...

por  exemplo...  se  a  pessoa  está  bem...  materialmente...
se  a  pessoa  está  passando  por  um  momento  na  sua  vida...
onde  sua  saúde  está  bem...
se  a  pessoa  está  em  paz  consigo  próprio...
está  com  o  corpo  limpo...
um  corpo  que  não  recebe  uma  gota de álcool...
um  pulmão  que  não  recebe  uma  baforada  de  fumo...
há  dois  anos  e  meio...
então...  esse  cuidado  que  estou  tendo  comigo...
ajuda  meu  self-esteem  a  ficar  cada  vez  mais  estável...
cada  vez  mais  tranquilo...

outros  exemplos...  consigo  me  lembrar  na  história  da  minha  vida...
por  exemplo...  quando  eu  tinha  20  anos  de  idade...
tranquei  a  matrícula  na  faculdade...
dava  aula  no  colégio  anglo-americano...
nas  segundas....  terças...  e  quartas-feiras...
quarta  à  tarde...  ia  pra  saquarema...
e  ficava  lá  pegando  onda  até  domingo...

era  uma  vida...  fisicamente  muito  saudável...
e...  nessa  fase...
acredito  que  meu  self-esteem  estava  bom  também...

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mas  todos  esses  exemplos  são  apenas  exemplos  físicos...
materiais...  relacionados  à  saúde...

e  nos  momentos   difíceis...?

justamente...  nos  momentos  difíceis...  o  que  podemos  fazer...?

querido  filho...
nesses  momentos...  aí  é  que  acho...
que  toda  a  atenção  deve  ser  redobrada...

é  justamente  nesses  momentos...
que...  se  quisermos  conseguir  vencer  a  batalha...
devemos  caprichar  ainda  mais...
nos  cuidados  necessários  para  não  nos  deixarmos  enfraquecer...

é  nessas  horas  que  devemos  fazer  de  tudo...
para nosso  organismo  ficar  o  mais  saudável possível...
cada  milímetro  de  descuido  pode  ser  fatal...

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vou  dar  um  exemplo  concreto  do  que  aconteceu  hoje...
nós  recebemos  hoje  de  manhã...  uma  visita  de  uma  amiga  nossa...
que  trouxe  um  fuminho...  para  nós  fumarmos...

na  hora...
até  que  me  deu  uma  vontadezinha  de  dar  uma  fumadinha...
mas  pensei...
"estou  me  sentindo  tão  bem  sem  fumar  nada  há  dois  anos  e  meio...
que  vou  continuar  mantendo  meu  corpo...  limpo..  e  saudável...
portanto...  não  vou  fumar"...

muito  bem...
se  eu  tivesse  fumado...
não  estaria  agora...  escrevendo  essa  carta  para   você...
estaria  cansado...  estaria  provavelmente...  dormindo...

mas  essa  carta  é  muito  importante...
eu  quero  estar  ao  seu  lado...  através  desse  email...
sei  que  você  e  o  peter  são  as  pessoas...
que  mais  quero  bem  nesse  mundo...
portanto...  ainda  bem  que  não  fumei...
senão...  provavelmente...
não  estaria  com  energias  físicas  para  estar  escrevendo  agora...

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estou  cada  vez  mais  convencido...
de  que  a  bebida  é  um  dos  maiores  "atrasos"  nessa  vida...
na   hora  a  pessoa  curte  aquela  sensação  de  "barato"...
mas  depois...  está  um  lixo...  sem  energias...
não  vale  a  pena...

aqui  em  recife...  as  pessoas  tem  o  costume  de  beber  muito...
quando  cheguei  do  hawaii...
já  cheguei  aqui  em  recife  bastante  educado  quanto  a  isso...

já  havia  aprendido  no  hawaii...
que  bebida  e  fumo  enfraquecem  os  rins...
e...  de  acordo  com  a  medicina-chinesa...
os  rins  são  um  dos  órgãos  mais  responsáveis...
pelo  bom-funcionamento  do  organismo...
se  os  rins  se  enfraquecem...
bye...  bye...
todo  o  organismo  se  enfraquece...

mas...
voltando  ao  papo  de   que  as  pessoas  aqui  em  recife  bebem  muito...
assim  que  cheguei  aqui...  (do  hawaii)..
percebi  que  o  pessoal  aqui  costuma  beber  muito...

pensam  que...  se  beberem...  vão  se  tornar  mais  sensíveis...
o  papo  vai  fluir  melhor....  etc...

percebi  logo  que  esse  tipo  de  pensamento...
é  como  se  fosse  uma  "canoa-furada"...
é  uma  ilusão...
as  pessoas  estão  crentes  que  estão  "abafando"...
mas  estão  é  cavando  a  própria  sepultura...

percebi  logo...  que  o  caminho  não  era  esse...
pensei  comigo...
eles...  se  quiserem  beber...  podem  beber...
eu...  não  vou  entrar  nessa...
pois  sei  que  é  uma  "canoa-furada"...  uma  ilusão  passageira...
que  vai  minando  a  saúde  da  pessoa  rapidinho...

resultado...  dois  anos-e-meio  se  passaram...
a  turma  chegada  à  bebida...
vai  aos  poucos  percebendo  que  eu  é  que  estava  (e  estou )  certo...
( por  exemplo...  quando  vou  nessas  festinhas-de-família...
   de  aniversário...)

sinto  que  eles  estão  começando  a  perceber  que  eu  estou  certíssimo...
vou  nas  festinhas  de  aniversário  das  crianças...
enquanto  todo  mundo  está  "enchendo  a  cara"...
eu  estou  tomando  meu  copinho  d’água...  (sem  gelo)...
(pois  eles  sabem  que  eu  não  gosto  de  refrigerante)...

converso  com  todo  mundo  numa  boa...
dou  maior  atenção  para  todo  mundo...  numa  boa...
saio  da  festa  tranquilo...  feliz  da  vida  comigo  mesmo...
cheio  de  saúde...  tranquilo...
com  a  certeza  de  que  passarei  uma  noite  bem  tranquila...
sem  dor-de-cabeça...
e...  no  dia  seguinte...  sem  dor-de-cabeça...

enquanto  isso...  estão  eles...  pra  lá  de  marrakesh..
no  dia  seguinte  todos  fudidos...  se  arrependendo  de  ter  bebido...

só  que...  sinto  que...  muitos  deles...  já  estão  percebendo...
através  do  meu  exemplo...  que  eu  estou  certíssimo...
tanto  é  que  alguns  deles  já  estão  começando  a  me  imitar...

tem  dias  que  decidem  não  beber...  etc...

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então...  meu  filho...
todos  esses  casos  que  acabei  de  falar...
estão  relacionados  com  o  tema  principal  dessa  carta...

ou  seja...  do  self-esteem...

nessa  estória...
(de  eu  manter  minha  filosofia  do  copo  d’água...
  nas  festinhas  infantis  daqui  de  recife...)
eu  jamais  teria  a  "coragem"  de  seguir  minha  própria  consciência...
se  eu  não  soubesse  já de  antemão...
que  a  bebida  é  um  atraso-de-vida...

essa  consciência...  eu  adquiri...  no  hawaii..
graças  àquele  problema  sério  que  eu  tive  no  meu  nervo  ciático...

graças  às  influências  de  uma  menina  acupunturista  que  me  curou...
fui  introduzido  aos  conhecimentos  da  medicina  chinesa...

conhecimentos  esses  que  me  educaram  ao  ponto  de  eu...
quando  cheguei  aqui  em  recife...
ter  tido  a  plena  consciência  de  que  os  costumes  daqui....
"beber...  beber...  e  beber"...
eram  simplesmente...  de  uma  burrice  sem  tamanho...

mas...  só  pude  ter  essa  certeza...  essa  auto-determinação...
essa  auto-confiança...  porque  tive  a  sorte  de...  no  hawaii...
ter  encontrado  essa  menina...
que  me  introduziu  aos  conhecimentos  da  medicina  chinesa...

conhecimentos  esses  que  foram  comprovados  na  prática...
na  medida  em  que  eu  ia  ficando  bom...

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então...  no  caso  de  eu  me  encontrar  meio  perdido...
na  turminha  do  vítorino...
era  porque  eu  não  tinha  experiência  nenhuma  de vida...
me  encontrava  num  grupo-social...
onde  tudo  para  mim...  era  desconhecido...
me  sentia  inseguro...
com  medo...
exatamente  porque  não  conhecia...
não  dominava  a  língua...
não  dominava  a  linguagem  específica  daquele  grupo  social...

mas...  na  medida  em  que  crescemos...
novas  vivências  penetram  em  nossas  experiências...
e...  portanto...
estamos  mais  aptos  a  nos  comunicar  nos  diversos  grupos-sociais...
que  vão  surgindo  por  aí...

acho  que  essa  poderia  ser  uma  das  explicações...
para  o  que  você  bem  observou  na  sua  carta...
quando  você  disse  que  essa  timidez...
era  uma  característica  do  passado...
mas  que...  hoje  em  dia...  você  se  sente  bem  mais  confiante...

quanto  a  Evy...  acho  que...  ela  também...  como  todos  nós...
às  vezes...  passa  por  momentos  de insegurança...
frente  a  certos  ambientes  em  que  ela...
provavelmente  possa  estar  se  sentindo  um  pouco  insegura...
devido  ao  fato  de  ela  perceber  que...
naquele  determinado  grupo-social  (dos  seus  amiguinhos)...
possam  existir  crianças  que...  talvez...  possam  representar...
para  ela...  um  certo  perigo...
(ou  no  sentido  físico...(bater  nela  etc)...
ou  no  sentido  moral...(rir  dela...  caçoar  dela...
achar  que  ela  "doesn´t fit there" ...  essas  coisas...)...)

não  devemos  nos  esquecer  que...  infelizmente...  nós  seres-humanos...
assim  como  os  animais...  encontramo-nos...  às  vezes...  em  situações...
onde  existe  a  lei  da  selva...
ou  seja...  às  vezes ..
existem  situações  onde  um  ser-humano  quer  "comer"  o  outro...
 e  essa  destruição  tem  várias  faces...
às  vezes...  a  tentativa  de  destruição   é  física...
(dar  uma  porrada  no  outro...  etc....)
às  vezes...  a  tentativa  é  na  dimensão  moral...
(fazer  intrigas...  fofocas....  falar  mal  da  pessoa...
  ridicularizar...  caçoar....     etc...)

e...  portanto...  como  todos  nós  já  levamos...  algum  dia...
esse  tipo  de  porrada...  ( seja  ela...  física  ou  moral )...
então... quando  estamos  diante  de  um  grupo-social...
cujos  costumes  e  linguagens  são  estranhos  para  nós...
é  natural  que  nos  sintamos  inseguros...
já  que  nosso  principal  instrumento  de  relacionamento...
...é  a  palavra...

mas  se  não  dominamos  bem  a  linguagem  do  tal  grupo-social...
como  poderemos  nos  garantir...
em  termos  de  podermos  nos  comunicar...
de  modo  que  todos  nos  respeitem...?

para  isso  é  necessário  sabermos...
1....  quem  é  esse  grupo  que  estamos  interagindo...
2...  como  nos  comunicar...
3...  saber  escutar...
4...  saber  se  comportar  de  uma  forma  gentil...
  etc...  etc...

isso  tudo  a gente  aprende  com  o  tempo...  e  com  a  prática...

e...  se  por  acaso...  nos  vemos  diante  de  um  grupo...
onde  nos  sentimos  completamente  estranhos...
tudo  bem...
se  temos  a  consciência  de  que  todos  nós  seres-humanos...
somos  limitados  e  imperfeitos...
who  cares...?
não  há  motivo  nenhum  para  nos  sentirmos  deslocados...

nessas  horas...  o  melhor  que  temos  a  fazer  é...
assumirmos  quem  somos...
batermos  papo  naturalmente...
e..  já  de  cara...  abrir  o  jogo....
mostrar  ao  grupo  nossa  verdadeira  face...
respeitando  o  grupo...
mas..  sabendo  que  o  grupo  também  vai  nos  respeitar...

caso  contrário...  se  o  grupo  se  acha  tão  melhor  do  que  nós  assim...

nesse  caso...
bye...  bye...

a  vida  continua...
vocês  (do  grupo)  que  tenham  uma  boa  vida...
continuem  com  a  vida  de  vocês...
que  vou  procurar  minha  turma...
até  a  próxima...  bye...  bye...

pois  a  vida  é  curta...
não  vou  ficar  a  vida  inteira  suplicando  migalhas  da  sua  mesa...
se  quiserem  se  relacionar  comigo  de  um  modo  respeitoso...  ótimo...

caso  contrário...  tchau...  tchau...

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é  isso  aí...
querido  filho  tauê...
esse  tema  é  muito  interessante...
ele  envolve  muita  psicologia...
foi  bom  você  ter  tocado  nesse  assunto...  na  sua  carta...
pois  é  um  tema  que  vale  a  pena  ser  visto  com  carinho...

esse  tema  da  timidez  é  tão  importante...
que  vale-a-pena  dar  uma  olhadinha  à  seguinte  pergunta...
cuja  resposta  está...  obviamente...  relacionada  à  timidez...

"por  que  é  que...  normalmente...  as  pessoas  bebem  nas  festas...?..."

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grandessíssimo  abraço...?
grandessíssimo  abraço...

adorei  sua  carta...  meu  filho...
continua  assim...

até  já...
um  abraço...
com  carinho...
seu  pai...
               ...luis antonio...