querido filho tauê...
querido filho peter...
no colégio andrews...
lutando... ( psicologicamente ).. comigo mesmo...
para me adaptar a esse ambiente... digamos... " burguês "...
(... tão diferente do colégio militar...)
fui... lentamente... pegando a "manha"...
percebendo qual eram os ( novos ) valores do novo ambiente em
que eu me encontrava...
mas... muitas vezes... eu ainda me sentia desconfortável...
em inúmeras situações...
já que... o contraste... ( a diferença )... entre essas duas
escolas era... digamos...
quase que infinito...
esse meu desconforto...
acabou se manifestando... no dia em que...
recebi... repentinamente... um telefonema...
de duas meninas lá do colégio...
eu estava tranquilo.. em casa...
quando o telefone tocou...
era a bebel...
queria apenas "jogar-conversa-fora"...
ou seja... queria apenas "bater-um-papinho" desinteressado...
talvez... ver... qual era a minha...
sabe...?... essas coisas de uma menina de 14 anos de idade...
dando um telefonema para um colega-de-escola...
apenas isso... nada de mais...
e eu... completamente desacostumado com essa situação...
completamente desacostumado em receber um telefonema de uma garota...
completamente habituado a conviver com aquela turminha da
malandragem do rocha-pinto...
falando sobre mulheres o dia inteiro...
(... mas sem nunca ter se aproximado de uma mulher...)
eu... ao receber o telefonema da bebel...
... fiquei meio... como que... meio... digamos... paralisado...
não sabia o que fazer...
não sabia o que falar...
me pegou de surpresa...
ela... tentando puxar um papo...
tranquila... querendo saber qual era a minha...
e eu... meio me vendo numa situação... meio de desespero...
sem saber por onde começar...
de repente...
sentindo que eu deveria falar alguma coisa...
sentindo que no "timing" do diálogo...
estava na minha vez de falar...
o ponto infinitesimal do instante preciso...
impunha... " a bola está contigo ( luis ) "...
"... é agora ou nunca..."
"... o momento é esse... tem que falar... agora... já..."
me sentí como se estivesse na beira de um trampolim...
( um trampolim altíssimo )...
onde as circunstâncias me obrigassem a tomar uma decisão...
ou... talvez... eu não pudesse nem tomar decisão nenhuma...
as próprias circunstâncias me "empurrassem" do trampolim...
rumo à piscina...
enfim... eu tinha que falar alguma coisa...
naquele preciso instante...
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aí falei:..
" vai a merda... "
(... e desliguei...)
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eu mesmo fiquei perplexo com os acontecimentos...
no momento... logo após ter desligado o telefone...
eu não senti nada...
não senti arrependimento...
não senti que havia feito algo de errado...
mas também.... não senti que havia feito algo de bom...
não senti nada...
estava apenas... perplexo...
sem saber ao certo o que estava se passando...
uns cinco minutos depois...
o telefone toca...
era sua amiga... ( esqueci o nome...)...
( a amiga da bebel... que estava com ela...)
atendi...
ela falou:...
"obrigado pela sua grosseria"...
( e desligou...)
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aí sim...
aí... eu... devagarzinho...
fui me "tocando" da besteira que tinha feito...
mas... apesar dos pesares...
nessa idade... nós damos esse tipo de "mancada"..
.
no início... nos sentimos meio mal...
mas... poucos dias depois...
a coisa fica meio no esquecimento...
e tudo volta ao normal...
mas... mesmo assim...
de vez em quando...
eu me perguntava...
" o que foi que houve...?...
... por que agi assim...?..."
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hoje-em-dia...
talvez... eu possa me arriscar...
na tentativa de dar uma explicação...
ou... pelo menos... tentar entender o que se passou...
talvez... o que tenha acontecido...
foi um excesso de medo...
talvez... eu tenha me apavorado com a possibilidade de
cometer algum erro...
dentro da possibilidade de eu não ter uma "performance" boa...
no que se refere... ao ato de saber conversar com uma
garota no telefone...
e... esse pavor...
talvez... tenha me levado a cometer essa espécie de "suicídio"...
ou seja... mandar a garota ir à merda... e desligar o telefone...
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nós... no colégio militar...
sonhávamos com uma situação desse tipo:...
tipo... poder estudar num colégio misto...
onde as meninas e os meninos conviviam juntos...
e... sonhávamos também... em poder ter uma vida normal...
em poder ter uma namoradinha... etc...
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então...
o fato de eu já ter conseguido...
me mudar para um colégio misto... tipo andrews...
por si só... já trazia muitas expectativas...
todo aquele desejo reprimido ( vindo do colégio militar )...
se manifestou... de uma forma muito abrupta... muito repentina...
nessa mudança... ( também repentina...)
do colégio militar para o andrews...
a minha mudança do colégio militar para o andrews...
não foi algo que eu cavei...
não foi resultado de uma ação minha...
um dia...
meus pais receberam um telegrama do colégio militar...
pedindo que eles fossem lá falar com o capitão-psicólogo-do-colégio...
foram... meu pai... e minha mãe...
lá... ver o que o capitão-psicólogo tinha a dizer...
ele explicou... que era do regulamento do colégio...
expulsar os alunos que atingissem uma nota-de-comportamento...
abaixo de 3.0...
meu comportamento já estava... 3.2...
se eu pegasse... digamos mais dois dias de detenção...
meu comportamento iria para 2.8...
( já que cada dia de detenção corresponde a uma queda de
0.2 no comportamento...)
nessa época eu vivia pegando detenção atrás de detenção...
por besteirinhas tipo... não cortar o cabelo no dia certo... etc...
aí o capitão falou para meus pais...
" olha... eu aconselharia... vocês tirarem ele da escola...
... por "livre-e-espontânea-vontade"... do que passar pelo risco...
... de ele ser expulso... e isso não seria bom para ele...
... pois iria ficar com a "ficha-suja"... como expulso
do colégio militar..."
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acho que no fundo... minha mãe até que gostou...
de que tudo isso estivesse acontecendo...
pois ela sabia que eu detestava o colégio militar...
como ela é muito prática...
e... como ela sabia que o vítorino estudava no andrews...
... ela não perdeu tempo...
foi rapidinho no andrews...
conversou com a secretária... ( ou diretor ... sei lá...)...
e... rapidinho... providenciou minha transferência...
do colégio militar... para o andrews...
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quando... em casa...
ela me avisa das novidades...
fiquei... simplesmente... maravilhado...
" nossa... nem acredito...
... muito bom pra ser verdade..."
ela falou numa boa...
sem dar "bronca" nenhuma...
pelo contrário...
senti nela uma felicidade muito grande...
de estar presenciando um momento tão histórico na minha vida...
sair de um colégio tão antiquado...
tão opressor...
tão repressor...
... ... para um outro nível-de-colégio...
... ... o colégio andrews...
que abrigava a fina-nata da sociedade carioca...
filhos de diplomatas...
filhos de magnatas...
filhos de gente da alta-society...
(... mas também pessoas normais..
como qualquer outra pessoa...)
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mais-ou-menos um mês depois do famoso telefonema da bebel...
onde uma força-invisível fez com que eu agisse daquela
maneira horrível...
meu amigo charles-sekino me perguntou no ônibus...
" afinal... o que houve...?..." ( se referindo ao telefonema )...
eu contei a ele toda a verdade...
que ela me telefonou...
e que eu mandei ela ir à merda...
aí ele falou...
"... pô... não entendi..."
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ele falou sem maiores julgamentos...
sem maiores críticas...
simplesmente comentou numa boa...
" ... pô... não entendi..."
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a partir desse comentário dele...
passei a refletir melhor sobre a mancada que eu tinha dado...
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eu... na minha distração...
continuei minha vida numa boa...
sem dar muita atenção ao episódio...
mas... o inconsciente... acaba revelando mensagens...
nos momentos em que menos esperamos...
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semanas depois do famoso telefonema...
eu proponho ao vítorino...
organizarmos uma super-festa-de-arromba...
na casa da rua jota-carlos...
convidamos a banda-de-rock que o rocha-pinto conhecia...
não para tocar ao vivo...
mas para instalar o super-som com direito a amplificador e
caixas-de-som...
convidamos... é claro...
toda aquela turma-do-vítorino de teresópolis...
a turma do rocha-pinto ... ( da lagoa )...
e... algumas pessoas do andrews...
dentre essas... eu estava muito atento... em incluir a
bebel-e-suas-amigas...
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ao comentar com o vítorino...
a minha preocupação em entregar o convite para a bebel...
o vítorino comentou...
" estou notando que você está fazendo essa festa...
... ...para a bebel..."
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...( acho que ela nem foi...
...nem me lembro......)
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a vida é assim mesmo...
phd em mancadas...?
é comigo mesmo...
mas... a vida é assim mesmo...
graças às mancadas...
nós acabamos nos tornando cada vez menos...
" bicho-do-mato"...
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fico por aqui...
desejando que vocês...
continuem cuidando bem da saúde...
(... física... mental... e... espiritual...)
espero que tudo esteja bem por aí...
aguardo notícias...
com carinho...
um grande abraço...
seu pai...
...luis antonio...