...16... filosofando part sixteen... ( 16 out of 18 )...

querido  filho  tauê...
querido  filho  peter...

no  colégio  andrews...
lutando...  ( psicologicamente )..  comigo  mesmo...
para  me  adaptar  a  esse  ambiente...  digamos...  " burguês "...
(... tão  diferente  do  colégio  militar...)
fui...  lentamente...  pegando  a  "manha"...
percebendo  qual  eram  os  ( novos )  valores  do  novo  ambiente  em
 que  eu  me  encontrava...

mas...  muitas  vezes...  eu  ainda  me  sentia  desconfortável...
em  inúmeras  situações...
já  que...  o  contraste... ( a  diferença )...  entre  essas  duas
escolas  era...  digamos...
quase  que  infinito...

esse  meu  desconforto...
acabou  se  manifestando... no  dia  em  que...
recebi...  repentinamente...  um  telefonema...
de  duas  meninas  lá  do  colégio...

eu  estava  tranquilo..  em  casa...
quando  o  telefone  tocou...

era  a  bebel...
queria  apenas  "jogar-conversa-fora"...
ou  seja...  queria  apenas  "bater-um-papinho"  desinteressado...

talvez...  ver...  qual  era  a  minha...
sabe...?...  essas  coisas  de  uma  menina  de  14  anos  de  idade...
dando  um  telefonema  para  um  colega-de-escola...

apenas  isso...  nada  de  mais...

e  eu...  completamente  desacostumado  com  essa  situação...
completamente  desacostumado  em  receber  um  telefonema  de  uma  garota...
completamente  habituado  a  conviver  com  aquela  turminha  da
malandragem  do  rocha-pinto...
falando  sobre  mulheres  o  dia  inteiro...
(... mas  sem  nunca  ter  se  aproximado  de  uma  mulher...)

eu...  ao  receber  o  telefonema  da  bebel...
... fiquei  meio...  como  que...  meio...  digamos...  paralisado...

não  sabia  o  que  fazer...
não  sabia  o  que  falar...

me  pegou  de  surpresa...

ela...  tentando  puxar  um  papo...
tranquila...  querendo  saber  qual  era  a  minha...

e  eu...  meio  me  vendo  numa  situação...  meio  de  desespero...
sem  saber  por  onde  começar...

de repente...
sentindo  que  eu  deveria  falar  alguma  coisa...
sentindo  que  no  "timing"  do  diálogo...
estava  na  minha  vez  de  falar...

o  ponto  infinitesimal  do  instante  preciso...
impunha... " a  bola  está  contigo  ( luis ) "...
"... é  agora  ou  nunca..."
"... o  momento  é  esse...  tem  que  falar...  agora...  já..."

me  sentí  como  se  estivesse  na  beira  de  um  trampolim...
( um  trampolim  altíssimo )...
onde  as  circunstâncias  me  obrigassem  a  tomar  uma  decisão...

ou...  talvez...  eu  não  pudesse  nem  tomar  decisão  nenhuma...
as  próprias  circunstâncias  me  "empurrassem"  do  trampolim...
rumo  à  piscina...

enfim...  eu  tinha  que  falar  alguma  coisa...
naquele  preciso  instante...

---   ---   ---

aí  falei:..

" vai  a  merda... "

(...  e  desliguei...)

---   ---   ---

eu  mesmo  fiquei  perplexo  com  os  acontecimentos...

no  momento...  logo  após  ter  desligado  o  telefone...
eu  não  senti  nada...
não  senti  arrependimento...
não  senti  que  havia  feito  algo  de  errado...
mas  também....  não  senti  que  havia  feito  algo  de  bom...

não  senti  nada...
estava  apenas...  perplexo...
sem  saber  ao  certo  o  que  estava  se  passando...

uns  cinco  minutos  depois...
o  telefone  toca...

era  sua  amiga...  ( esqueci  o  nome...)...
( a  amiga  da  bebel...  que  estava  com  ela...)

atendi...

ela  falou:...
"obrigado  pela  sua  grosseria"...
( e  desligou...)

---   ---   ---

aí  sim...
aí...  eu...  devagarzinho...
fui  me  "tocando"  da  besteira  que  tinha  feito...

mas...  apesar  dos  pesares...
nessa  idade...  nós  damos  esse  tipo  de  "mancada"..
.
no  início...  nos  sentimos  meio  mal...
mas...  poucos  dias  depois...
a  coisa  fica  meio  no  esquecimento...
e  tudo  volta  ao  normal...

mas...  mesmo  assim...
de  vez  em  quando...
eu  me  perguntava...
" o  que  foi  que  houve...?...
...   por que  agi  assim...?..."

---   ---   ---

hoje-em-dia...
talvez...  eu  possa  me  arriscar...
na  tentativa  de  dar  uma  explicação...
ou...  pelo  menos...  tentar  entender  o  que  se  passou...

talvez...  o  que  tenha  acontecido...
foi  um  excesso  de  medo...

talvez...  eu  tenha  me  apavorado  com  a  possibilidade  de
cometer  algum  erro...
dentro  da  possibilidade  de  eu  não  ter  uma  "performance"  boa...
no  que  se  refere...  ao  ato  de  saber  conversar  com  uma
garota  no  telefone...

e...  esse  pavor...
talvez...  tenha  me  levado  a  cometer  essa  espécie  de  "suicídio"...
ou  seja...  mandar  a  garota  ir  à  merda...  e  desligar  o  telefone...

---   ---   ---

nós...  no  colégio  militar...
sonhávamos  com  uma  situação  desse  tipo:...
tipo...  poder  estudar  num  colégio  misto...
onde  as  meninas  e  os  meninos  conviviam  juntos...

e...  sonhávamos  também...  em  poder  ter  uma  vida  normal...
em  poder  ter  uma  namoradinha...  etc...

--   ---   ---

então...
o  fato  de  eu  já  ter  conseguido...
me  mudar  para  um  colégio  misto...  tipo  andrews...
por  si  só...  já  trazia  muitas  expectativas...

todo  aquele  desejo  reprimido  ( vindo  do  colégio  militar )...
se  manifestou...  de  uma  forma  muito  abrupta...  muito  repentina...
nessa  mudança...  ( também  repentina...)
do  colégio  militar  para  o  andrews...

a  minha  mudança  do  colégio militar  para  o  andrews...
não  foi  algo  que  eu  cavei...
não  foi  resultado  de  uma  ação  minha...

um  dia...
meus  pais  receberam  um  telegrama  do  colégio militar...
pedindo  que  eles  fossem  lá  falar  com  o  capitão-psicólogo-do-colégio...

foram...  meu  pai...  e  minha  mãe...
lá...  ver  o  que  o  capitão-psicólogo  tinha  a  dizer...

ele  explicou...  que  era  do  regulamento  do  colégio...
expulsar  os  alunos  que  atingissem  uma  nota-de-comportamento...
abaixo  de  3.0...

meu  comportamento  já  estava... 3.2...

se  eu  pegasse...  digamos  mais  dois  dias  de  detenção...
meu  comportamento  iria  para  2.8...
( já  que  cada  dia  de  detenção  corresponde  a  uma  queda  de
    0.2  no  comportamento...)

nessa  época  eu  vivia  pegando  detenção  atrás  de  detenção...
por  besteirinhas  tipo...  não  cortar  o  cabelo  no  dia  certo...  etc...

aí  o  capitão  falou  para  meus  pais...
" olha...  eu  aconselharia...  vocês  tirarem  ele  da  escola...
 ...  por  "livre-e-espontânea-vontade"...  do  que  passar  pelo  risco...
    ...  de  ele  ser  expulso...  e  isso  não  seria  bom  para  ele...
       ...  pois  iria  ficar  com  a  "ficha-suja"... como  expulso
              do  colégio  militar..."

---   ---   ---

acho  que  no  fundo...  minha  mãe  até  que  gostou...
de  que  tudo  isso  estivesse  acontecendo...

pois  ela  sabia  que  eu  detestava  o  colégio  militar...

como  ela  é  muito  prática...
e...  como  ela  sabia  que  o  vítorino  estudava  no  andrews...

...  ela  não  perdeu  tempo...
foi  rapidinho  no  andrews...
conversou  com  a  secretária...  ( ou  diretor ...  sei  lá...)...
e...  rapidinho...  providenciou  minha  transferência...
do  colégio militar...  para  o  andrews...

---   ---   ---

quando...  em  casa...
ela  me  avisa  das  novidades...
fiquei...  simplesmente...  maravilhado...

" nossa...  nem  acredito...
 ...  muito  bom  pra  ser  verdade..."

ela  falou  numa  boa...
sem  dar  "bronca"  nenhuma...

pelo  contrário...
senti  nela  uma  felicidade  muito  grande...
de  estar  presenciando  um  momento  tão  histórico  na  minha  vida...
sair  de  um  colégio  tão  antiquado...
tão  opressor...
tão  repressor...
...  ...  para  um  outro  nível-de-colégio...
...  ...  o  colégio  andrews...
que  abrigava  a  fina-nata  da  sociedade  carioca...
filhos  de  diplomatas...
filhos  de  magnatas...
filhos  de  gente  da  alta-society...
(...  mas  também  pessoas  normais..
         como  qualquer  outra  pessoa...)

---   ---   ---

mais-ou-menos  um  mês  depois  do  famoso  telefonema  da  bebel...
onde  uma  força-invisível  fez  com  que  eu  agisse  daquela
maneira  horrível...

meu  amigo  charles-sekino  me  perguntou  no  ônibus...
" afinal...  o  que  houve...?..."  ( se  referindo  ao  telefonema )...

eu  contei  a  ele  toda  a  verdade...
que  ela  me  telefonou...
e  que  eu  mandei  ela  ir  à  merda...

aí  ele  falou...
"...  pô...  não  entendi..."

---   ---   ---

ele  falou  sem  maiores  julgamentos...
sem  maiores  críticas...

simplesmente  comentou  numa  boa...
" ...  pô...  não  entendi..."

---   ---   ---

a  partir  desse  comentário  dele...
passei  a  refletir  melhor  sobre  a  mancada  que  eu  tinha  dado...

---   ---   ---

eu...  na  minha  distração...
continuei  minha  vida  numa  boa...
sem  dar  muita  atenção  ao  episódio...

mas...  o  inconsciente...  acaba  revelando  mensagens...
nos  momentos  em  que  menos  esperamos...

---   ---   ---

semanas  depois  do  famoso  telefonema...
eu  proponho  ao  vítorino...
organizarmos  uma  super-festa-de-arromba...
na  casa  da  rua  jota-carlos...

convidamos  a  banda-de-rock  que  o  rocha-pinto  conhecia...
não  para  tocar  ao  vivo...
mas  para  instalar  o  super-som  com  direito  a  amplificador  e
caixas-de-som...

convidamos...  é  claro...
toda  aquela  turma-do-vítorino  de  teresópolis...
a  turma  do  rocha-pinto  ...  ( da  lagoa )...
e...  algumas  pessoas  do  andrews...

dentre  essas...  eu  estava  muito  atento...  em  incluir  a
bebel-e-suas-amigas...

---   ---   ---

ao  comentar  com  o  vítorino...
a  minha  preocupação  em  entregar  o  convite  para  a  bebel...

o  vítorino  comentou...
" estou  notando  que  você  está  fazendo  essa  festa...
... ...para  a  bebel..."

---   ---   ---

...( acho  que  ela  nem  foi...
       ...nem  me  lembro......)

---   ---   ---

a  vida  é  assim  mesmo...
phd  em  mancadas...?
é  comigo  mesmo...

mas...  a  vida  é  assim  mesmo...
graças  às  mancadas...
nós  acabamos  nos  tornando  cada  vez  menos...
" bicho-do-mato"...

---   ---   ---

fico  por  aqui...
desejando  que  vocês...
continuem  cuidando  bem  da  saúde...
(... física...   mental...  e...   espiritual...)

espero  que  tudo  esteja  bem  por  aí...
aguardo  notícias...
com  carinho...

um  grande  abraço...
seu  pai...
               ...luis antonio...